Folha de S. Paulo


O fantasma de Dilma 1

Dilma Rousseff estava feliz com as derrotas da oposição, dizia-se de modo sarcástico numa roda de poder e dinheiro na sexta-feira. Joaquim Levy caiu, Michel Temer, o vice, é comido feito um boi pelas piranhas adversárias do PMDB e o líder da oposição no Supremo, Gilmar Mendes, foi voto vencido. "O problema é quando a Dilma ganha. O fracasso sobe à cabeça", dizia um dono de dinheiro.

O time do impeachment vai desmoralizado para o segundo tempo. O que a presidente fará no intervalo, no recesso até o Carnaval? Começou por fazer uma substituição na defesa, Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda.

Barbosa vai jogar mais livre ou Dilma vai definir seus movimentos? A dúvida é se o fantasma de Dilma 1 vai reassumir o governo e a economia. A crise financeira será tanto maior quanto mais a refazenda da presidente cheirar a cravo de defunto, aroma da política econômica do primeiro mandato, aquela paródia grotesca e ginasiana do desenvolvimentismo do general-ditador Geisel.

Não haverá ajuste fiscal algum, francamente. No máximo, remendos menores no buraco das contas do governo, remendos nos quais de resto ninguém acredita e, a esta altura do desastre, irrelevantes.

Barbosa sabe disso, assim como a finança, seus porta-vozes no "mercado" e certo empresariado graúdo. A diferença está nas soluções. Essa elite econômica espera um choque, um pacote grande de "reformas".

Não haverá dinheiro tão cedo. A ruína pode ser contida com a perspectiva de mudanças maiores na economia, feitas já. Ainda que produzam resultados só daqui a alguns anos, a antecipação de dias melhores atenuaria a crise de agora.

Barbosa jamais acreditou no plano fiscal de Levy, a ferro e a fogo no curto prazo. Aos poucos alardeou seu programa de tapar o buraco de modo "gradual" e de "reequilibrar a economia" com algum incentivo ao crescimento, o que agradou a Dilma e derrubou Levy.

É um mistério esse incentivo para "reequilibrar" a economia, esse plano de tirar a meia sem tirar o sapato. Quanto mais parecer um plano infalível de Dilma ou um "estímulo à demanda", maior o tumulto, dólar e juros em alta. A dúvida é apenas sobre o tamanho da degradação.

Uma política sem grandes voos heterodoxos ou ortodoxos pode resultar em algum tipo de sarneyzação econômica, piora contínua sem estouros. Assim, vai se comer o "arroz com feijão" de Barbosa. Em seguida ele mesmo será canibalizado, destino comum dos breves ministros da economia do Brasil dos tempos de crise e bagunça, que imaginávamos passados.

Pode ser pior, pois a política está se desmilinguindo. Barbosa corre o risco de ter menos esteio que Levy.

Observe-se, de modo anedótico, como se autodevora o partido que faz duas semanas oferecia uma "ponte para o futuro" ou a "agenda Brasil", o PMDB. Num dia, estava endomingado com programas sérios e liberais; no outro, ontem, brigava de faca em um beco sujo de corrupção. Cresce a fila na porta da cadeia. O governo é feito de ministros medíocres ou velhacos, se não procurados pela polícia. A oposição se desmoralizou de vez no acordo oportunista com pulhas. A crise, enfim, não é anedótica. É um fim dos tempos, de uma República.

É nesse mar que Barbosa vai tocar o barquinho da economia.


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