Folha de S. Paulo


Política e crédito no lixo

O desmoronamento de governo e Congresso é tamanho que a piora da economia devida ao descrédito extra do país tende a não ser muito notável. Além do presente desgoverno, há perspectiva de desgoverno adiante, de imobilismo no caso da permanência de Dilma Rousseff, de incerteza sobre o que restará da cúpula política e, portanto, de quem de fato assumirá o poder.

O rebaixamento da nota de crédito do Brasil, o aumento da taxa básica de juros nos Estados Unidos e a demissão provisória do ministro da Fazenda devem fazer com que o crédito para governo e, em particular, empresas se torne um tanto mais caro e escasso. No entanto, os donos do dinheiro grosso do mundo já haviam degradado o crédito do país, como de costume, por sua própria conta e aversão a risco.

Sempre se pode descer mais um degrau para o inferno financeiro, tal como aconteceu em setembro, por exemplo. Mas não foi o que acabou de acontecer. O próximo passo do fracasso dependerá da duração da paralisia ou de besteira pior que possa acontecer. Qual?

Não é possível nem especular, pois o sistema político está descontrolado, se esboroando a cada revelação de policiais ou procuradores, para nem falar de prisões. O governo, por sua vez, se debate em desespero e não tem nem ao menos plano do que fazer do mais elementar e urgente, a crise econômica. Do Planalto, começam a surgir boatos de uma "virada responsável à esquerda". O ambiente está propício a disparates e aventuras variados, do Congresso ao Planalto, passando pelas "ruas".

Isto posto, a piora adicional das condições de financiamento de governo e empresas é grave. O governo e suas empresas são agora, para muitos efeitos práticos e legais, um investimento de risco grande demais para ser tolerado por certos tipos de investidor estrangeiro. O efeito real e imediato, no dinheiro, é difícil dimensionar, pois não há um mapa de quem investe o que no Brasil. No entanto, a degradação extra do crédito parece diminuída pela ruína progressiva dos planos já diminutos do governo e das alternativas de poder.

Como se notou nesta semana, o PMDB começa a implodir ou partes deles estão minadas. Houve as batidas policiais nas casas de ministros peemedebistas. Houve a ameaça de batida na casa do presidente do Senado, Renan Calheiros, cada vez mais cercado porque seus conhecidos cada vez mais caem no arrastão da Justiça. O PMDB do Rio vai sendo mais e mais arrastado no maelstrom de lama de Eduardo Cunha, que começa a respingar nas cercanias de Eduardo Paes, prefeito do Rio.

Como se percebeu ontem, o processo de impeachment caminhará no Congresso. Como se sabe faz semanas, o PMDB de Michel Temer arrebanha deputados para afastar a presidente. Como se tem notado pelo clima "das ruas" e das organizações da sociedade civil, o país está muito mais dividido quanto ao impeachment do que o grande desprestígio da presidente parecia indicar. O conflito a respeito da deposição de Dilma Rousseff causará estragos.

Esse tumulto prejudica o que resta de condições de governo e do rearranjo de forças políticas que, em qualquer caso, deem rumo ao país. Essa é a grande degradação, aí está o grande risco de mais ruína econômica.


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