Folha de S. Paulo


Luta de classes na Ilha Fiscal

Há um grupo de empresários ativo na política da crise que "tolera" aumento de impostos mas "encaminha sugestões" de corte de despesas públicas, tem paciência limitada e pragmática com Dilma Rousseff e prefere que a saúde do governo se estabilize, ainda que em nível crítico, até antes de novembro.

Essa é a cara simpática da coisa. Algumas dessas pessoas não acreditam que o governo vá arranjar os mais de R$ 60 bilhões que faltam para que se entregue um projeto de Orçamento com superavit primário de 0,7% do PIB em 2016. A maioria, aliás, nem se ocupa desses detalhes.

Os bons economistas que trabalham para essas pessoas, quase todos com passagens pelo governo, fazem previsões disparatadas de resultado primário, de zero a deficit de 1% do PIB em 2016, diferença de mais de R$ 60 bilhões.

Então qual é a conversa? Sem novidades no front, afora a ideia de que o governo tem um mês, por aí, para arrumar qualquer coisa que ponha ordem na casa.

Todo mundo parece cônscio do calendário da crise: Lula ameaça largar Dilma, em outubro o TCU manda as contas condenadas da presidente ao Congresso e em novembro o PMDB pode pular do barco.

No mais, trata-se de:

1) Manter Joaquim Levy, por ora a âncora de um plano do que, acham, deve ser feito da política econômica. No mínimo, porque ainda não sabem o que viria após Levy ou Dilma-Levy, para nem falar do tumulto da transição e do "povo na rua";

2) Estabilizar a situação, dar "um jeito" no Orçamento de 2016, com cortes sociais "inevitáveis" e contenção de reajustes de salário mínimo e servidores. Tudo de modo a preparar talho mais "estrutural": reforma administrativa, revisão de contratos, Orçamento "base zero" e cadeado de gastos do INSS. Se necessário, algum "sacrifício": até imposto ruim (variantes de CMPF) e, ora vejam, sobre heranças ("não vai render grande coisa").

Essa é uma versão bem organizada do que se diz. Essas pessoas não estão preocupadas com tecnicalidades. Têm "programas" tão informais quanto isso que se aqui se chama de "grupo": são mais uma rede de banqueiros maiores, empresários grandes e consultores. Todos dão palpites discretos ou participam de discussões de assuntos públicos, mas de hábito se mantêm à margem da política. Pode-se chamá-los, por comodidade, de "Comitê Levy".

Há ao menos um outro "comitê", com muitos industriais, de gente mais envolvida em política, vários próximos do PMDB. Seguram-se para não pedir explicitamente a cabeça de Dilma. Como parte relevante do PMDB, vários têm birra de Levy. Quanto ao destino da presidente, importam-se mais com o "timing" político do que com a economia.

Fazem campanha furiosa contra impostos. Vários sentem saudade do "nacional-empresismo" do desenvolvimentismo dilmiano. Seriam o Comitê Industrialista. Alguém pode chamá-los de Linha Fiesp-Firjan-CNI, mas nesse mundo também há divergências grandes.

Aliás, é difícil ouvir empresário e executivo de qualquer ramo que não queira ver a presidente pelas costas já. Foram contidos graças às declarações públicas de banqueiros maiores pedindo "calma, pessoal" –muitas dessas pessoas temem banqueiros grandes. Mas a paciência parece se esgotar em todas as frentes.

vinit@uol.com.br


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