SÃO PAULO - O Leve Leite, cujo escopo foi agora reduzido pela Prefeitura de São Paulo, é um fóssil das teorias de combate à pobreza que prevaleceram na virada do século 20 para o 21. Elas culpavam a desnutrição pela chaga da renda baixa.
Sem as calorias mínimas necessárias, as pessoas não conseguem desempenhar um trabalho produtivo o suficiente para alimentar-se melhor no dia seguinte. Ficam, desse modo, presas numa arapuca que as condena à indigência vitalícia.
A teoria é elegante e inatacável, mas na prática poucas situações de "armadilha da pobreza" foram identificadas, mesmo nas regiões mais empobrecidas do planeta.
Enquanto a renda dos mais pobres cresceu fortemente na Índia nas últimas décadas, o consumo de calorias per capita caiu. Numa pesquisa controlada no Quênia, famílias que receberam um incremento em sua renda não elevaram seu consumo de alimentos na mesma proporção.
As ações mais eficazes de combate à pobreza, à luz do acúmulo sem precedentes de estudos desse tipo, parecem hoje mais associadas a intervenções contextualizadas de precisão. Que as crianças recebam profilaxia contra vermes na escola, que gestantes e filhos pequenos obtenham nutrientes, como ferro, vitais para o pleno desenvolvimento físico e intelectual.
Nas políticas de largo espectro, reduzir as faltas de professores e agentes de saúde é crucial. Consagraram-se os repasses diretos de renda aos mais pobres, inclusive os que não condicionam o dinheiro a frequência escolar ou visitas ao médico. Saneamento é como sangue nas veias.
O Brasil ainda tem problemas associados à etapa básica do desenvolvimento humano, mas seu principal desafio é a superação de uma outra armadilha, a da renda média. Nesse caso, infelizmente, teoria e prática coincidem ao apontar que a maioria das nações não consegue chegar ao estágio superior.