Folha de S. Paulo


O voo do Super-Homem

SÃO PAULO - O que permite ao Super-Homem voar? Na antiga lenda grega, Dédalo e seu filho Ícaro mimetizam as asas dos pássaros, usando penas e cera. Já o herói da capa vermelha que veio de Krypton não se presta a nenhum trabalho de verossimilhança. Apenas levita e voa.

É inútil pensar em empuxo, arrasto, sustentação ou consumo de energia. Como na célebre cena do Barão de Münchhausen, que puxa os próprios cabelos para livrar-se do afogamento, o voo do Super-Homem é fantasia ensimesmada. Não se relaciona com o mundo físico ao redor.

Quimeras assim às vezes engolfam o pensamento econômico, sem poupar os profissionais mais dotados, que ciclicamente incidem na crença da valorização perpétua de ativos financeiros. Há seis anos o mundo paga o preço do mais recente desvario.

A imaturidade, o corporativismo e as ideologias também hipnotizam. Movimentos juvenis exigem "tarifa zero" no transporte urbano. Outros grisalhos defendem a "gratuidade" nas universidades públicas. Há economista a advogar que o governo amplie ainda mais os gastos e a dívida para impulsionar o crescimento.

Em todos esses casos, quando os proponentes não enganam a si mesmos, é o público que iludem. O liame oculto nessas bandeiras empurra contas bilionárias para quem paga impostos em situações tão corriqueiras como a compra num açougue ou a reforma da casa.

O despertar do encanto se dá na tarefa de cotejar quem paga tributos, de um lado, com os beneficiários da despesa e dos empréstimos estatais, do outro. O método mostra que o devedor da dívida pública não é o governo, mas sim dezenas de milhões de brasileiros mal remediados, cujo trabalho remunera, com 5% do que o país produz todo ano, um grupo bem menor de financiadores do Tesouro.

Desse modo se atinge o estágio da lucidez, no qual Super-Homem, se quiser voar, que compre o bilhete num avião de carreira.


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