Folha de S. Paulo


Intervenção no IBGE

SÃO PAULO - Mais preocupante que o grave erro cometido pelo IBGE em sua pesquisa por amostragem domiciliar é a ameaça de intervenção do Palácio do Planalto no órgão de pesquisa. Na sexta-feira (19), o governo federal anunciou a instalação de duas comissões de sindicância no instituto a propósito, ou a pretexto, da falha.

Em abril, o Ipea, outro órgão federal de estudos, cometeu uma barbaridade numa pesquisa a respeito da violência contra a mulher. Divulgou que 65% dos brasileiros concordavam com uma frase machista sobre ataque sexual. A cifra real era 26%.

Corrigiu-se, mas não foi alvo da reação "perplexa" da presidente da República, tampouco foi ameaçado com intervenção. Que se saiba, nenhuma sindicância externa foi instalada para averiguar o Ipea. Nenhum pesquisador, muito menos o presidente do instituto, correu o risco de ser demitido.

A direção do Ipea desde o governo Lula alinhou-se ao esquerdismo de oportunidade e sobretudo ao governismo desbragado. A sua obsessão de justificar e de encontrar números e interpretações para exaltar a política pública oficial correu na contramão da credibilidade do instituto. É uma pena, porque o Ipea abriga excelentes pesquisadores.

A chefia do IBGE sempre foi mais difícil de cooptar. Essa é uma das diferenças do Brasil em relação à Argentina e à Venezuela, onde os órgãos de estatística produzem os dados que o governo quer. Agora, com o erro na Pnad e em meio a uma guerrilha sindical contra a presidente do IBGE, alguém no governo Dilma enxergou uma oportunidade.

Quem começa com sindicância na Pnad pode em seguida inquirir o IBGE acerca dos índices de inflação, de desemprego e de atividade econômica que calcula. Aqueles que prezam a independência e a credibilidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística deveriam lutar para que essa porta não seja arrombada.


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