Folha de S. Paulo


Mangas de fora

SÃO PAULO - Quando Michel Temer pensou em dar o Ministério da Justiça para Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, era impossível que ignorasse as críticas do advogado à Lava Jato.

Ainda assim, colou a versão de que o presidente interino se surpreendeu ao ler entrevistas nas quais Mariz se limitou a repetir o que sempre disse. Era um lapso do criminalista, e Temer posou de bom moço.

A pasta à qual a Polícia Federal se vincula terminou nas mãos de outro advogado, Alexandre de Moraes. Em entrevista a esta Folha, ele defendeu mudanças na forma como o chefe do Ministério Público Federal tem sido escolhido desde 2003. Como a proposta soou a interferência no MPF, Temer desautorizou seu subordinado. Era só uma opinião pessoal.

Uma semana depois, tornaram-se públicos diálogos gravados por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro. Em um deles, o senador Romero Jucá sugere um pacto para deter a Lava Jato e menciona conversas com ministros do Supremo.

Jucá perdeu o Planejamento no episódio, mas não se afastou de Temer. Apesar disso, a boa vontade com o governo ficou inalterada.

Vendo esse clima favorável, mais gente botou as mangas de fora. O presidente do Senado, Renan Calheiros, empenha-se para aprovar um projeto de lei que esteriliza a delação premiada e outro que intimida juízes e investigadores.

Na Câmara, Temer deu aval nesta semana para que fosse retirada a urgência de um pacote de medidas anticorrupção. No STF, alguns ministros já indicam a possibilidade de rever julgamento que autorizou prisão a partir da segunda instância —decisão tomada em fevereiro e considerada um marco contra a impunidade.

Os milhões que foram às ruas protestar contra Dilma Rousseff também levantaram a bandeira da República de Curitiba. Pelo silêncio atual, todos parecem crer que tantas ameaças à Lava Jato não passam de lapsos e iniciativas individuais —ou talvez estejam botando as mangas de fora.


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