Folha de S. Paulo


Superior na América do Sul, falta ao Brasil enfrentar grandes da Europa

Pedro Martins/Mowa Press
Tite durante Treino da Seleção Brasileira antes do jogo contra o Equador pela sétima rodada das eliminatórias sul-americanas para a Copa da Rússia de 2018 em Quito. Foto: Pedro Martins / MoWA Press ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Tite conversa com jogadores durante treino em Quito, no Equador, antes de jogo pelas eliminatórias

Nas duas últimas Copas de Mundo, houve boa participação e evolução das seleções sul-americanas. Eu esperava, nas eliminatórias atuais, muito mais qualidade. O Brasil é exceção. As nove vitórias e as ótimas atuações são decorrentes dos méritos da equipe e também da surpreendente fragilidade dos rivais.

Por causa das diferenças na formação dos jogadores e na maneira de atuar, Europa e América do Sul possuem características próprias. A globalização tem limites. Existem também particularidades em cada país de um mesmo continente.

No Brasil, há décadas, o meio-campo é dividido entre os volantes que marcam e os meias que atacam. Desapareceram os clássicos meio-campistas, que atuam de uma área à outra. As jogadas de ataque passaram a ser feitas mais por chutões, passes longos, estocadas individuais e pelo avanço dos laterais. Por isso, predominam os meias e atacantes habilidosos, velozes e que gostam do confronto individual.

Já na Europa, como os laterais sempre foram defensores, os armadores tiveram de ser ofensivos e defensivos. Assim, houve um predomínio de meio-campistas de talento, que gostam de trocar passes e de ter o comando da bola e do jogo.

Há exceções nos dois continentes. Essa diferença também tem mudado. Existe uma nítida preocupação, na Europa, em formar meias e atacantes hábeis e velozes e, no Brasil, em formar volantes com habilidade, que marcam e atacam.

As características dos jogadores e da maneira de atuar têm a ver também com a genética, as diferenças culturais, econômicas e sociais e os comportamentos emocionais.

Os argentinos tinham esperança que Sampaoli formaria, rapidamente, um ótimo conjunto, como ocorreu com Tite, no Brasil. Houve mudanças táticas, o time dominou a partida contra o Uruguai, mas criou pouquíssimas chances de gol, dependente demais de Messi, muito marcado, às vezes, com violência. O centroavante Icardi quase não pegou na bola. O jovem meia Dybala ficou perdido, sem saber seu lugar, geralmente, ocupando o mesmo espaço de Messi.

Como era previsto, o Brasil, pela primeira vez, com Tite, usou uma opção tática para mudar o jogo. É um avanço. Após um primeiro tempo ruim, o time melhorou muito, com a saída de um volante (Renato Augusto) e a entrada de um meia pelo centro, Philippe Coutinho. Isso não significa que esta é a melhor alternativa para começar o jogo.

O Equador só se defendia, e era necessário trocar um jogador de meio-campo por outro mais próximo ao gol. Paulinho, mais uma vez, mostrou que é um ótimo armador atacante e um discreto meio-campista. Tite sabe disso e o usa muito bem. No Tottenham, queriam que ele fosse um clássico meio-campista.

Neymar atuou mal, quase somente pelo meio, onde tentava driblar milhares de pernas. Por causa da fama crescente e de ser agora a grande estrela do PSG, parece ter havido, contra o Equador, um retrocesso, uma obsessão por driblar vários jogadores, em todos os lances, e fazer gols de placa, como ocorria no Santos.

São indiscutíveis as qualidades da seleção brasileira, mas não haveria excessiva valorização, por causa da enorme superioridade sobre os times sul-americanos? Imagino que os confrontos contra as melhores seleções europeias serão equilibrados, sem favoritos. Nesta situação, o talento de Neymar será essencial.


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