Folha de S. Paulo


Saber compartimentado

É bastante prematuro avaliar a Libertadores após uma rodada, mas minha expectativa, que pode estar equivocada, é a de que os times brasileiros se reforçaram e os rivais sul-americanos se enfraqueceram, por causa do aumento, pelos clubes do Brasil, do grande número de bons jogadores desses países.

A diferença de investimento dos clubes brasileiros em relação ao dos outros sul-americanos é enorme. Mesmo assim, as partidas costumam ser equilibradas. Parece até que o Brasil é um país rico. Argentina, Chile, Uruguai e até a Venezuela possuem IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) melhores que o do Brasil, segundo Relatório de Desenvolvimento Humano de 2015, da Organização das Nações Unidas.

Além das contratações, houve, após o 7 a 1, aos poucos, uma reconstrução da maneira de jogar dos times brasileiros, apesar dos vícios acumulados por um longo tempo, como o excesso de bolas cruzadas na área e o de atuar com os zagueiros muito atrás, colados à grande área. Por outro lado, há nítida preocupação dos jovens técnicos e dos mais experientes, que acompanharam a evolução do futebol, de pressionar quem está com a bola, alternar, no mesmo jogo, a marcação mais adiantada e a mais recuada, de trocar mais passes, de diminuir espaços entre os setores e de atacar e de defender com mais jogadores.

Ter muita informação e conhecimentos teóricos não significa necessariamente eficiência. Muitos treinadores possuem dificuldades de implantar e de juntar seus conceitos. Boas ideias só funcionam bem se estão conectadas umas às outras. O saber não é compartimentado. Atuar com os zagueiros adiantados, como muitas equipes tentam fazer, só dá certo se for acompanhado por intensa marcação por pressão, para não permitir que o rival se organize e faça lançamentos nas costas dos defensores, mesmo que o goleiro saiba jogar bem fora do gol.

Essa falta de sincronismo é uma das falhas marcantes nos times dirigidos por Cristóvão Borges, o que também tem ocorrido com o São Paulo, sob o comando de Rogério Ceni.

Não vi erro do goleiro Denis no primeiro gol do Palmeiras. Os méritos são de Eduardo Baptista, que orientou os jogadores a pressionar a saída de bola e a não deixar o São Paulo trocar passes, uma das qualidades do time, e de Dudu, rápido e preciso na finalização por cobertura. Já o terceiro gol foi falha feia do goleiro. O São Paulo necessita de um goleiro com mais qualidade.

Além dos bons jogos da Libertadores, teremos hoje Monaco x Manchester City, pela Liga dos Campeões. Na primeira partida, os ingleses venceram por 5 a 3. Poderia ter sido 6 a 6. Os dois times marcavam na frente, tomavam a bola e chegavam com muitos jogadores ao ataque.

Na prancheta, o Manchester City, dirigido por Guardiola, joga como o Cruzeiro dos anos 1960, com quatro defensores, apenas um volante (Yaya Touré também avança trocando passes), dois meias ofensivos (David Silva e De Bruyne), que estão sempre perto do gol adversário -no Cruzeiro, éramos eu e Dirceu Lopes-, além de dois pontas abertos e um centroavante.

A grande diferença é que o City e as atuais grandes equipes atacam com sete ou oito jogadores e, quando não recuperam a bola onde ela foi perdida, recompõem, rapidamente, e marcam com oito a nove jogadores, perto da área. É um dos avanços do futebol moderno.


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