Folha de S. Paulo


Sorriso escancarado

Na coluna de quarta-feira, confiei em minha memória, a de quase um setentão, e cometi três erros. Imperdoáveis! A final da Copa do Brasil entre Corinthians e Grêmio foi em 2001, e não em 2000. O placar foi 3 a 1 para o Grêmio, e não 2 a 0. E o jogo foi no Morumbi, não no Pacaembu. Não posso mais viver sem o Google, o pai dos desmemoriados.

Em outra coluna, escrevi que a história não é rigidamente dividida entre um período e outro, com datas determinadas de separação. Fatos opostos, contraditórios, geralmente acontecem ao mesmo tempo. O 7 a 1 foi marcante, mas a queda de nosso futebol começou muitos anos antes. Não dá para precisar a data.

Após o Mundial, os técnicos brasileiros saíram em defesa de Felipão e do futebol que se jogava no Brasil. Luxemburgo disse que não viu nada de novo na Copa. Isso mudou. Agora, todos querem viajar para aprender na Europa e/ou para dizer que estão atualizados. Virou quase uma obrigação, ainda mais para quem está desempregado.

A chave que os técnicos procuram na Europa, como se também não existissem coisas ruins por lá, está na transformação do jogo de espasmos, de sobressaltos, de lances individuais e isolados, fragmentado, que predominou no futebol brasileiro nos últimos tempos, em um jogo coletivo. Vários técnicos brasileiros já fazem isso. A chave não está em nenhum cofre. Está no gramado, no saber ver.

"O essencial é saber ver, saber ver sem estar a pensar, saber ver quando se vê, e nem pensar quando se vê, nem ver quando se pensa" (Fernando Pessoa).

Tite, após um ano sabático, falou que evoluiu na maneira de organizar o time na passagem da bola da defesa para o ataque. Temos visto isso.

Dunga gosta de dizer que se encontrou e conversou com os grandes técnicos europeus. Como teriam sido esses contatos? Durante o café da manhã, entre uma entrevista e outra ou durante todo um dia, como foi o encontro, na Argentina, entre Guardiola e seu mestre, Loco Bielsa, antes de Guardiola ficar famoso como técnico?

Mano Menezes fez o curso completo na Uefa, em Portugal. Ele já pode ser técnico de qualquer time da primeira divisão da Europa. A Uefa não reconhece os cursos realizados no Brasil, muito menos os da CBF, que, anos atrás, usou uma apostila "feita" por Parreira, que era uma cópia de conceitos de um técnico inglês dos anos 1960, no período em que os times ingleses quase só faziam gols em bolas aéreas. Deve ser uma das razões que os chuveirinhos proliferaram no Brasil.

Muricy chegou de Barcelona maravilhado. Parece que esteve no paraíso do futebol. Ele faz questão de dizer que sua estadia lá foi oficial, que teve acesso a todos os detalhes, como se dissesse: "com os outros, foi diferente".

Dorival Júnior, para não ficar atrás, falou, nesta semana, que também viajou para a Europa e que apenas não tinha dito nada à imprensa.

Independentemente do que fizeram fora do Brasil, os técnicos vão se beneficiar dessas viagens, seja para adquirir conhecimentos, fazer uma reciclagem, mostrar que estão atualizados ou apenas para tirar uma selfie, em algum ponto turístico, com o sorriso escancarado, esperando um novo contrato chegar.


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