Folha de S. Paulo


Avanços e retrocessos

A desorganização do futebol brasileiro era tão alarmante, grotesca, que, mesmo os dirigentes não fazendo nada para mudar, algumas pequenas coisas avançaram, por inércia ou compaixão. O mesmo ocorre quando melhoram um pouco os péssimos índices sociais do país, feitos alardeados como grandes conquistas pelos políticos e governos.

Apesar da desorganização atual, achava que era coisa do passado um time como o Cruzeiro jogar duas partidas decisivas, domingo e terça, por duas semanas seguidas, em campeonatos diferentes. Aconteceu algo semelhante, recentemente, com o Corinthians. É um retrocesso.

Cruzeiro e São Paulo tiveram muitas coisas em comum, no meio dessa semana. Atuaram em péssimos gramados e estádios, as atuações individuais e coletivas foram ruins, enfrentaram fracos adversários e jogaram com três volantes sem habilidade para avançar, desconectados com os três mais adiantados. Marcelo Oliveira, que evoluiu muito nos últimos anos, teve um momento de retrocesso.

A diferença foi que o Cruzeiro perdeu e o São Paulo venceu, graças aos ótimos cruzamentos de Michel Bastos. Ele atua bem pela direita, de onde vai para o centro, para finalizar, e também na esquerda, de onde cruza forte e em curva, com a bola saindo do goleiro. A vitória não foi por causa das substituições nem porque teve mais raça do que nos jogos anteriores.

Cruzeiro e São Paulo jogaram no mesmo sistema tático do Real Madrid, do Barcelona e do Bayern, as três melhores equipes do mundo. Das três, somente o Barcelona venceu na Liga dos Campeões. A grande diferença é o talento dos três armadores dessas equipes, que marcam, avançam e se misturam com os três mais adiantados.

Se Denilson e Wesley tivessem jogado, não melhoraria em nada. No mesmo dia, o volante Casemiro, desprezado pelo São Paulo, tinha mais uma excelente atuação pelo Porto. Ele vai voltar ao Real Madrid, de onde saiu emprestado. No São Paulo, Casemiro era chamado de marrento, por gostar de dar passes de efeito (só quem sabe faz isso), e de lento, por gostar de trocar passes e de ficar com a bola. Essa é uma visão estreita, que dominou o futebol brasileiro durante longo tempo.

Dos times brasileiros na Libertadores, brilhou apenas o Inter, que ainda não se classificou. Levir Culpi, que avançou no ano passado, na maneira de jogar do Atlético-MG, teve também um instante de retrocesso, ao substituir Pratto, quando todos jogavam mal, com exceção de Victor. Corinthians e San Lorenzo fizeram um jogo tático, organizado, mas sem nenhum brilho. A pressão bem feita, dos dois times, em quem estava com a bola não deixou a outra equipe jogar.

A vida e o futebol são feitos de avanços e de retrocessos. "A vida dá muitas voltas, a vida nem é da gente" (João Guimarães Rosa). Mas muitas coisas no futebol brasileiro nunca avançam. Ficam estagnadas ou pioram, como a violência nos clássicos estaduais, a qualidade mediana da maioria das equipes, os erros graves e frequentes dos árbitros e a mentalidade dos presidentes da CBF e da maioria dos dirigentes das federações e dos clubes.

Estou de férias. Até breve!


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