Folha de S. Paulo


A garfada na ração

El Cerdo
Ilustração para a coluna Bichos de 10/04 da revista sãopaulo

Que a crise chegou à mesa do brasileiro, já não é novidade. Os alimentos subiram 124% nos últimos dez anos, enquanto a inflação oficial ficou em 78%. Agora, a garfada vai chegar à ração do cachorro. Não dá a sensação de que só faltava essa?

No fim de janeiro, a presidente Dilma Rousseff -escrevo em 3 de abril, ela ainda é presidente- assinou um decreto alterando o imposto sobre chocolate, sorvete, fumo picado e... Ração de cães e gatos! Sim, sobre itens tidos como supérfluos!

Pelas novas regras, a partir de 1º de maio, sorvetes pagarão 5% de IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados), rações, 10%, e fumo, 30%.

Havia controvérsia jurídica, pois há uma regra do IPI que prevê alíquota zero para "preparações destinadas a fornecer a totalidade dos elementos nutritivos necessários para alimentação diária racional e equilibrada". Agora, essa descrição se aplica só à comida de bichos de produção (suínos, bovinos e aves).

O entendimento do governo fora traduzido em 2011, em decisão do ministro Teori Zavascki, então no Superior Tribunal de Justiça, hoje no Supremo Tribunal Federal. Ele negou alíquota zero a um fabricante de ração para pets porque "o IPI é regido pelo princípio da seletividade" e "as alíquotas são reduzidas ou majoradas conforme a essencialidade ou superficialidade dos produtos".

"Nesse sentido", escreveu, "entendo que a tabela de incidência do IPI o fez em razão da dispensabilidade do produto". E continuou: "Ora, o sustento de tais animais domésticos de estimação reserva-se, em geral, ao mero deleite de seus donos".

Deleite?

O governo que sobe o IPI da ração de cães e gatos é o mesmo que, também em 2011, reconheceu os bichos como membros das famílias e incluiu veterinários entre os profissionais que devem integrar Núcleos de Saúde da Família. Vai entender...

Talvez a razão esteja nos números: a regra sobe em R$ 76 milhões as receitas tributárias com o ramo neste ano e em R$ 137 milhões em 2017. Que coerência resiste a tantos zeros?


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