Folha de S. Paulo


Muito além do açaí

Era para ser apenas uma saidinha rápida, para um açaí, em um domingo de sol. Moro na Granja Viana, uma região instalada na borda oeste da capital, entre municípios como Embu das Artes, Cotia, Carapicuíba e Osasco. Não faltam frutarias por ali. E escolhemos aleatoriamente uma delas.

O local é meio empório, meio quitanda, meio sorveteria, meio café. Vende produtos orgânicos em uma construção feita à base de material reciclável em volta de uma enorme árvore, um pé de Santa Bárbara, a alguns metros da rodovia Raposo Tavares (uma das mais movimentadas da Grande São Paulo). Já me parecia interessante o bastante... Mas tinha mais.

Sentamos numa mesa no fundo da quitanda, ao pé da árvore. E eles imediatamente apareceram. Um, dois, três, quatro pequenos esquilos correndo pelos galhos. Mais uma vez, já me parecia o bastante...

Mas tinha mais. Os esquilos passaram a descer até a altura das mesas e pegar castanhas-do-pará das mãos dos clientes. Alguns comiam segurando os dedos das pessoas. Outros aceitavam um breve carinho. As crianças gargalhavam, encantadas. Eu emudeci, encantada.

Ilustração Tiago Elcerdo

Percebi que são uma atração do lugar. Os saquinhos de castanha ficam prontos na prateleira. O casal Frey, dono da quitanda, diz que tudo começou quando a filha deles achou um bichinho machucado, há anos, e cuidou dele até que ficasse bom.

Curado, o esquilo foi solto no pé de Santa Bárbara e, vez por outra, voltava para buscar alguma guloseima. Foi trazendo amigos, e o hábito, ganhando adeptos. Hoje, a família de bichinhos consome dez quilos de castanha por mês.

Fiquei ali um tempão: dando castanha a eles, fotografando, filmando, desfrutando da deliciosa confiança daqueles pequenos seres e admirando o quanto a vida é bela em todas as suas muitas formas.

Era para ser apenas uma saidinha rápida em um domingo de sol. Mas virou muito mais.

Em tempo: o açaí estava ótimo.


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