Folha de S. Paulo


STF vira protagonista da Lava Jato

Pedro Ladeira/Folhapress
O senador Delcídio do Amaral (PT-MS), preso pela Polícia Federal, em Brasília (DF), na manhã de quarta-feira
O senador Delcídio do Amaral (PT-MS), preso pela PF, em Brasília (DF), na manhã de quarta (25)

Muita gente acha que nada vai mudar no Brasil, que essa hipercrise é sinal cabal de que o país nunca mudou nem mudará. Mas ela pode ser o contrário —sinal natural de que as coisas estão mudando.

Afinal, o antigo regime, de cinco séculos, não acabará sem uma hipercrise, aquilo que antes chamavam de revolução.

A operação Lava Jato é revolucionária, o maior ataque ao regime autoritário da corrupção. A democracia um dia nos libertará dessa ditadura eleita. E pode ser que não seja no voto, mas na toga. Afinal, um Judiciário independente é tão pilar da democracia quanto eleições livres.

O juiz Sergio Moro, com a razão que lhe é peculiar, protestou outro dia que a Lava Jato era "uma voz pregando no deserto". E sentenciou: "Apesar dessas revelações e de todo o impacto desse processo, não tivemos respostas institucionais relevantes por parte do nosso Congresso e por parte do nosso governo."

O governo, esquece. Desgoverna. Mas algo importante aconteceu ontem no Supremo Tribunal Federal e no Senado.

Nos misteriosos caminhos da Lava Jato, grampo feito pelo filho de um delator corrupto flagrou um senador petista do altíssimo clero não só conspirando contra as investigações, mas envolvendo na trama juízes do STF.

O Tribunal supremo, que apesar da urgência do tema andava inercialmente devagar, como se lentidão fosse parte do fazer Justiça no Brasil, foi firme e célere ao mandar prender o senador e foi firme e célere ao confirmar, de forma coletiva e indignada, a ordem no dia seguinte.

Foi um dia especial. Começou com a espetacular notícia da prisão do senador e do banqueiro. Na era da informação total e instantânea, logo pudemos ouvir no celular, no computador, no rádio e na TV a gravação do líder do governo no Senado propondo com a maior naturalidade coisas estarrecedoras.

Mobilizou as redes, que botaram pressão nos políticos. Mais tarde, o Senado entrou em campo, e logo pudemos ver expostos ao vivo na TV expoentes do antigo regime defendendo o antigo regime.

Confesso que quando Renan Calheiros passou a palavra a Jader Barbalho e ambos defenderam o voto secreto e a soltura do colega Delcídio do Amaral, lembrei do protesto de Moro. Mas o Senado, premido pelos fatos, pelo STF e, principalmente, pela opinião pública, se dobrou aos fatos, ao STF e, principalmente, à opinião pública. Numa votação aberta, inédita e histórica, manteve preso o senador.

No fim do dia, o agora ex-líder do governo Dilma no Senado passou sua primeira noite na cadeia, a primeira noite de um senador na cadeia.

Um marco que aponta para duas vitórias da Lava Jato: a entrada de cabeça do STF na operação e a capacidade da opinião pública de enquadrar o Congresso. Duas batalhas vencidas. Falta vencer a guerra.


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