Folha de S. Paulo


Como ganhar na década perdida

Voltamos. O Brasil anda para trás. O PIB é prova. Nossa economia produzirá menos neste ano. Menos pessoas estarão empregadas. Menos bens serão vendidos. Fala-se novamente em década perdida. Para quem passou por uma, dói só de escrever.

Dilma levou quatro anos destruindo a herança de FHC e Lula. Passará os próximos quatro tentando consertar o que fez. Se der tudo certo, estaremos em 2018 onde estávamos em 2010.

Depois de vender paraíso, o governo entregou purgatório. A queda brusca na realidade explica o espetáculo da impopularidade. A Lava Jato alimenta a revolta. E a esperança.

O maior entrave do Brasil hoje é a má política. O Estado toma mais de 35% do que se produz no país e gere muito mal nossa fortuna. Mesmo arrecadando tudo isso, a um custo enorme a todos, podemos agora perder o selo de bom pagador. É um fardo que não foi criado por nós, mas por um governo equivocado, perdulário e populista.

A primeira coluna que escrevi aqui, em 2007, tinha o título "É a política, estúpido". Falava que o avanço econômico não era acompanhado por avanço político, atrasando o país. A esperança era que o avanço econômico se impusesse sobre o atraso político. Aconteceu o contrário. A política travou a economia.

A exuberância econômica dos anos Lula anestesiou boa parte do país diante dos malfeitos explícitos da política. Lula reelegeu-se depois do mensalão. Dilma reelegeu-se depois do petrolão. Não que a corrupção seja exclusiva de governos petistas. Ela é generalizada, epidêmica.

A República de Curitiba agora atinge o coração dessa política, e os políticos já mostram que podem destruir o país se isso ajudá-los a escapar.

O momento, porém, é outro. Do mesmo jeito que a euforia econômica anestesiou a população contra a má política, a crise atual estimula a revolta contra ela. Se não a mudarmos, não mudaremos, agora sabemos.

E a luta pela boa política não pode opor situação e oposição, PT e PSDB, Lula e FHC. Ela opõe os locupletados ao resto do país. Os que querem acabar com a corrupção e os que querem mantê-la.

A clivagem direita-esquerda é mais uma estratégia cínica para mistificar os fatos e criar discurso. Quem entra nessa é inocente, para dizer o mínimo.

Na enorme maioria de brasileiros que condena o governo Dilma, há muito mais esquerdistas do que golpistas, muito mais pobres do que ricos, muito mais trabalhadores do que patrões.

A classe C emergente tem mais motivos para vaiar os ministros de Dilma do que a elite. É quem sofre mais porque tem menos recursos para se defender e porque, sonhando nas asas da propaganda petista, acordou num pesadelo.

Mas todo pesadelo acaba. Diante de tanto sofrimento, é possível ganhar a década.

Se a Lava Jato não for abatida pela República de Brasília, pode ser uma virada histórica na política brasileira, mais relevante que essa aguda crise.

Só assim ganharemos a década.


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