RIO DE JANEIRO - Publicamente incréu em todos os departamentos, tenho uma tendência a atrair místicos de vários matizes, de doutores em ectoplasma e reencarnação a praticantes de faquirismo e dança do ventre, passando por militantes das mais diversas seitas e religiões. A todos ouço com respeito, e volta e meia sou informado de que, baseado na posição das estrelas no dia e hora do meu nascimento –sou do signo de Peixes, com ascendente em Marisco e lua em Camarão—, alguém descobriu que, em vidas passadas, fui pastor de cabras na Assíria, secretário de Platão em Atenas e, mais recentemente, perfumista no Havaí.
Outras pessoas íntimas do Além já me confiaram que, há milênios, foram mascates de tâmaras em Bagdá, damas de honra de Cleópatra no Nilo ou cortesãs na Paris de Luís 15. Tudo muito distante e charmoso. Nunca encontrei alguém que me confessasse ter sido centerfór do Bonsucesso em 1949 ou copidesque do "Notícias Populares".
Mas isso era antes. Ouço dizer agora que, graças a terapeutas especializados, muita gente está descobrindo que a razão de seus problemas nesta vida reside nas bandalheiras que praticou em outras vidas. Para isto, foi criada a terapia de vidas passadas. Com a ajuda de um profissional, o sujeito regride àquelas vidas e, de alguma maneira, vai limpando a pedra até chegar aos dias de hoje. Um amigo meu estava confiante, mesmo sabendo que vaiou Jesus Cristo no sermão da montanha. Outro, que descobriu ter sido soldado bárbaro, acha mais difícil escapar.
O que os congressistas estão fazendo, ao tentar anistiar os gordos caixas dois que receberam no passado, é parecido. Se limparem suas sujíssimas fichas pregressas, prometem se comportar no futuro.
Pois sim. Todo político brasileiro já foi soldado bárbaro, e não há terapia, passada ou presente, que o absolva.