Folha de S. Paulo


Patrimônio perdido

Beth Santos-6.set,2015/Divulgação
O prefeito Eduardo Paes inaugurou neste domingo (06/09) a nova Praça Mauá, devolvendo à cidade e aos cariocas o novo espaço revitalizado do Porto Maravilha - com vista para a Baía de Guanabara. A festa seguiu com um dia de atividades gratuitas para adultos e crianças, incluindo shows de música, teatro e gastronomia ao ar livre. Fechada desde 2011 para obras do Túnel Rio450, inaugurado este ano, a praça reabre para moradores e turistas como a primeira da Orla da Guanabara Prefeito Luiz Paulo Conde
O prefeito Eduardo Paes participa da inauguração da praça Mauá, no Rio de Janeiro

RIO DE JANEIRO - Em 2012, a Unesco aprovou a escolha do Rio como patrimônio mundial, na categoria "paisagem cultural". Isso incluía não só o seu "excepcional cenário urbano", formado por insuperáveis elementos naturais, como também o desenvolvimento que eles inspiraram. Não são apenas os picos, praias, enseadas, florestas e lagoas, mas tudo que o homem produziu à sua volta, transformando-a, daí a expressão "paisagem cultural".

Muito da consciência do que o Rio representa vem de longe. De 1852, por exemplo, quando Manuel Antonio de Almeida publicou, em 41 domingos não consecutivos, no "Correio Mercantil", os episódios de uma história passada "no tempo do Rei" —o Rio do príncipe regente D. João, nos anos 1810. A essa história, Maneco, como o chamavam, deu o título de "Memórias de um Sargento de Milícias".

Seu poder de observação e descrição era tal que, lançado em livro, "Sargento de Milícias" tornou-se fonte indispensável para os historiadores —até hoje. Todo o Rio joanino está ali: profissões, costumes, valores, comida, festas, religiões. É também uma obra-prima da literatura.

Maneco escreveu-a aos 20 anos e morreu aos 30, em 1862, num naufrágio em Macaé. Levou 98 anos desde sua morte para virar nome de rua no Rio —e, mesmo assim, só ganhou uma humilde praceta adjacente à praça Mauá. Praceta esta que foi engolida há três anos na criação do Porto Maravilha e usada como canteiro de obras, sem placa nem nada. A nova praça Mauá nos foi devolvida há pouco. Só não existe mais a praça Manuel Antonio de Almeida.

Em troca, a Prefeitura do Rio acaba de inaugurar ali perto, junto ao armazém 7, na Gamboa, uma fulgurante, mas descabida praça Muhammad Ali. Por ironia, a dois quarteirões da rua do Propósito, onde nasceu Manuel Antonio de Almeida. Bela maneira de cuidar do patrimônio.


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