Folha de S. Paulo


Rumo à lanterna

RIO DE JANEIRO - Gostei de ouvir do ex-campeão mundial de xadrez Garry Kasparov que os seres humanos nunca serão dominados pelas máquinas. Torço para que ele esteja certo. A ideia de receber ordens de um computador ou de uma enceradeira nunca me agradou, mesmo tendo sido leitor voraz em 1968 do comunicólogo Marshall McLuhan, para quem o homem não demoraria a se tornar uma extensão de algum gadget eletrônico.

Kasparov sabe o que fala. Foi o primeiro campeão mundial de xadrez a perder para um computador, o Deep Blue, da IBM, e nem por isso se desesperou. Em 12 partidas contra o bicho, em 1996 e 1997, venceu quatro, empatou cinco e, incrivelmente, perdeu três. Por quê? Porque o computador percebe erros insignificantes que até um campeão comete, e que não seriam detectados por um adversário humano. Mesmo assim, Kasparov continua otimista –o homem também está aprendendo com o computador.

Já o prêmio Nobel de física Stephen Hawking, velho torcedor da inteligência artificial, acha inevitável o nosso rebaixamento à 2ª divisão. Os computadores já estão aprendendo por conta própria, diz ele, e, um dia, não conseguiremos acompanhar sua velocidade –no que estivermos indo, eles já estarão voltando.

O Brasil deveria se preocupar com isto. Segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), divulgados esta semana, 67% dos nossos meninos de 15 e 16 anos levariam zero em matemática, leitura e ciências se comparados a seus colegas de toda parte –e matemática, leitura e ciências são as línguas da inteligência artificial. Não por acaso, a pesquisa da OCDE nos coloca em 58º lugar entre 65 países. É quase a lanterna.

Daí eu torcer por Kasparov. Não gostaria de ver o Brasil dirigido por robôs frios, arrogantes e voltados apenas para si próprios.


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