Folha de S. Paulo


Santos modernos

RIO DE JANEIRO - A canonização dos papas João 23 e João Paulo 2º por seu colega Francisco abriu novas perspectivas para o gênero. Já não se exigem séculos para que o candidato se torne santo, nem que tenha sido um santo em vida. Nem é mais necessário que seja autor de dois milagres –um já está bom e, em certos casos, nem isso.

Assim, crescem as chances para os nossos eternos santificáveis: o padre Cícero, a irmã Dulce e a menina Odetinha. Embora o Vaticano os veja com ressalvas, seriam grandes exemplos de santos modernos. E, baseando-me no conceito inaugurado pelo papa Francisco, atrevo-me a sugerir outros ilustres brasileiros que não ficariam mal com um "são" antes do nome.

O maestro Pixinguinha seria uma barbada. Não apenas viveu em função da bondade, da beleza e da alegria, como morreu dentro de uma igreja, em Ipanema, no Carnaval de 1973. Outro santo da música popular seria o querido cantor Cyro Monteiro, que presenteava bebês de amigos com camisinhas do Flamengo e mantinha uma conta no pipoqueiro para os meninos de sua rua no Catete.

Entre os escritores, Nelson Rodrigues sempre disse que gostaria de ser um santo. Mas, à esquerda e à direita do papa, haveria muita oposição ao "anjo pornográfico". Já o poeta e médico Jorge de Lima, autor de "Invenção de Orfeu", seria uma unanimidade. Nunca um pobre, um desdentado teve de pagar para ser examinado por ele em seu consultório na Cinelândia.

No futebol, eu sugeriria o recém-falecido Bellini. Ninguém mais correto e humano –além de forte e viril, o que o faria alistar-se entre os santos guerreiros. Nas artes plásticas, Di Cavalcanti. Ele tornaria o céu mais divertido. Na política, apontem-me um. E, no jornalismo, só se valer a regra de que o verdadeiro santo é aquele que, como santo Agostinho, pecou muito em vida. Nesse caso, somos todos candidatos.


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