Folha de S. Paulo


Bons e maus amigos, conhecer e saber proteger as amizades de riscos

Uma conhecida pediu minha opinião a respeito de um fato ocorrido com a neta, de 14 anos, e da interferência que ela teve com os pais da garota na ocasião. Vou compartilhar com você, caro leitor, pois nos permite uma boa conversa a respeito da amizade.

A jovem havia sido convidada para uma festa de 15 anos e os pais não autorizaram sua ida por um bom motivo: conheciam o grupo e tinham certeza de que iria rolar bebida alcoólica no evento. Mesmo seguros de que dificilmente a filha cairia na tentação de beber, acharam mais seguro poupá-la desse risco.

Moacyr Lopes Junior/Folhapress
SANTOS, SP, BRASIL. 17.11.2015. A estudante Gabriella do Amparo Diniz, 13 ao caminhar com seu avo Claudio Teixeira Diniz, 72, na saida da E.E. Braz Cubas, em Santos, litoral de SP; a Defensoria Publica conseguiu uma decisao provisoria junto ao TJ para que a escola que atende alunos com limitacao de locomocao e intelectual nao seja fechada conforme orientacao da Secretaria da Educacao. (Foto: Moacyr Lopes Junior/Folhapress, COTIDIANO). ***EXCLUSIVO***
O avô Cláudio busca a neta Gabriella na escola em Santos (litoral de SP)

A garota, que costuma ter bons argumentos para conseguir o que quer, insistiu bastante com os pais, em vão. Como ela também aceita a decisão deles, mesmo passando um período emburrada, decidiu recorrer à avó, com quem tem, regularmente, bons diálogos e relacionamento estreito.

Para a avó, ela disse que o principal motivo que tinha para insistir na ida à festa era proteger uma amiga, que já vinha tomando bebida alcoólica sempre que conseguia, e que dissera a ela que não via a hora de chegar a festa para que bebesse até dar "PT" (perda total, gíria que os jovens usam para nomear o estado extremamente alcoolizado). E pediu à avó que conversasse com seus pais, mas que não contasse o motivo de ela querer tanto ir à festa, porque não queria que eles soubessem que sua amiga bebia.

Depois de hesitar e pensar bastante, a avó considerou louvável a intenção da garota e foi conversar com os pais dela. Cumpriu o que prometera à neta e não contou o real motivo da insistência, mas conseguiu convencê-los a darem sua permissão.

Minha conhecida disse que não conseguiu dormir até o dia seguinte à festa, porque pensou que talvez a neta a tivesse enganado. Mesmo conhecendo-a de perto, sabe muito bem o que é ser adolescente, pois é professora de ensino médio e relaciona-se regularmente com eles.

A história terminou bem: a neta não bebeu nada e contou que fez de tudo para distrair a amiga, que, mesmo tendo bebido um pouco, não ficou alterada.

Amizade é isso também: conhecer os amigos e saber protegê-los dos riscos que eles correm sem avaliar suas consequências. Muitos pais de adolescentes acreditam que há boas e más companhias para seus filhos e fazem intervenções indevidas e –pior– ineficazes, quando proíbem os filhos de algumas amizades. É melhor orientá-los, ouvi-los, dialogar com eles a respeito dos motivos que têm para considerar essas companhias não muito boas.

Só ouvindo os filhos é que os pais saberão mais a respeito deles e das razões que os levaram a se aproximar dessas pessoas. Afinal, alguma identificação, interesse, ligação, admiração, afeto etc. há, e é preciso procurar saber quais são.

Os pais precisam saber que, nos tempos atuais, em que é difícil saber o que é, verdadeiramente, a amizade, é preciso ensinar aos filhos a importância desse tipo de relação amorosa em suas/nossas vidas e as virtudes e atitudes necessárias para que esse vínculo seja mantido.

Ser amigo é cuidar do outro, querer o seu bem –sentimento que em geral é recíproco– e que quase sempre resulta em ações e reações, por mais alto que seja o custo pessoal delas.

Um dia, caro leitor, seu filho pode proteger e/ou ser protegido por um amigo, como o foi a amiga da neta de minha conhecida.


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