Folha de S. Paulo


Comida de criança

Imagine que seu filho possa viver menos do que você, e não por morte trágica. Esse é o novo fenômeno, e uma de suas causas é o alto índice de obesidade infantil. Por esse motivo, vamos hoje conversar a respeito da alimentação de nossas crianças.

Você acredita, caro leitor, que 60% das crianças brasileiras com menos de dois anos comem biscoitos, bolachas e bolos? E que 30% delas tomam refrigerante e sucos artificiais?

A partir de quando nós decidimos alimentar nossos filhos tão mal, sem pensarmos que isso poderia prejudicar a saúde deles? Por que será que só pensamos no prazer imediato que eles têm ao comer essas porcarias e nas facilidades de comprar alimentos industrializados?

Conversei com pediatras e todos confirmaram a hipótese: a obesidade infantil está muito mais associada a comportamentos do que a determinantes genéticos. Estes casos existem, mas são minoria.

Para começo de conversa, vamos lembrar: reeducar é mais difícil do que educar, e deseducar é mais fácil do que educar. Com esses princípios em mente, vamos refletir sobre como temos ensinado as crianças a se alimentar da maneira como o fazem atualmente.

Trabalhamos demais e temos pouco tempo para dedicar à cozinha. Falso ou verdadeiro? Falso. Trabalhamos em demasia, sim, mas no tempo restante queremos relações tranquilas e prazerosas com os filhos, certo?

O problema reside principalmente no fato de que educar pressupõe sempre, de algum modo, desagradar aos mais novos, e o quesito da alimentação não pode ser uma exceção! Quem quer garantia de carinha feliz do filho tende, porém, a oferecer apenas o que ele quer e gosta, e não o que pode fazer bem a ele, porque isso provoca resistências.

Devemos proibir terminantemente as crianças de comer essas porcarias? Não é preciso ser tão radical. Não ter em casa biscoitos e bolachas, sucos artificiais e refrigerantes, e salgadinhos e chips, por exemplo, já ajuda muito. Mas, quando a família sai para um passeio, pode permitir que o filho coma alguns desses alimentos. Isso faz com que diminua muito a quantidade ingerida e os pedidos insistentes para, em casa, trocar o prato de comida por uma gostosura doce ou salgada.

Um outro ponto é que criança precisa aprender a identificar seu índice de saciedade, e os pais devem ensiná-la. A frase "Agora chega" não precisa ser dita sempre: pode ser colocada em ato de diferentes modos. Retirar o alimento "tentação" da frente da criança e distraí-la para que ela não fique focada no que queria comer mais são duas atitudes que costumam funcionar, mas não são as únicas. Os pais podem encontrar outras estratégias para os filhos, já que os conhecem bem.

Por fim: nossos costumes alimentares influenciam bastante nossos filhos. Se as famílias conseguirem recuperar o ritual de fazer refeições juntos, além da educação para a boa alimentação –que depende, é claro, do que é servido– há também a oportunidade de a panelinha familiar funcionar.

Esse é um bom momento para que uns contem aos outros a respeito de sua vida, de seus sentimentos, fracassos etc. Tecer narrativas sobre a vida: as refeições em família são ótimas para isso.

Para concluir, vale lembrar: as estratégias para ensinar a criança a se cuidar bem vão ser muito importantes na adolescência dela porque o autocuidado sinaliza o amor à vida.


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