Folha de S. Paulo


Os papéis de filho e de aluno

Costumo ouvir muitas reclamações dos pais a respeito da escola dos filhos, desde que eles frequentam a educação infantil até o final do ensino médio. Bem, para falar francamente, ouço também queixas dos pais sobre as graduações que os filhos cursam, mas essa conversa vou deixar para outro dia.

Os motivos que os pais têm para reclamar da escola são diversos, e algumas vezes eles têm razão, outras não. Há pais que reclamam que a professora é muito brava ou exigente, por exemplo, e que isso faz com que o aluno tenha medo dela, perca o entusiasmo pelo estudo e que tenha ataques de ansiedade quando acontece algum esquecimento na escola.

Há pais que reclamam da quantidade de lição de casa: alguns acham que há lição demais, e outros consideram que o filho poderia progredir mais nos estudos se tivesse mais lição para fazer em casa.

Há reclamações a respeito de prazos de trabalho, de provas, de livros que são indicados para os alunos etc. Tudo pode ser motivo de reclamação quando os pais olham para o filho e se esquecem que, como aluno, ele exerce um papel diferente e, portanto, pode e deve aprender a ter atitudes diferentes.

Filho e aluno são papéis sociais diversos e tem sido difícil para muitos pais identificar a importância de o filho construir esse outro papel e de aprender a exercê-lo.

A escola, por sua vez, tem também muitas reclamações sobre os pais de seus alunos. Ela continua batendo na tecla, por exemplo, de que há muitos pais ausentes na vida do filho e que alguns deles terceirizam seu papel educativo a ela. E, para a escola, os pais ausentes são aqueles que, em geral, não comparecem às reuniões que ela promove.

Há outras reclamações: sobre o comportamento dos alunos, sobre o baixo aproveitamento escolar, sobre transgressões às regras da instituição etc. E, quase sempre, a escola credita aos pais todas essas questões. E como pais e escola agem quando se encontram para discutir essas questões? Muitos pais adoram vociferar com os profissionais escolares e exigir deles ações diferentes e, por sua vez, a maioria das escolas tenta justificar as atitudes tomadas. Há pouca escuta de um em relação ao outro.

O problema dessa dificuldade de diálogo entre essas duas instituições importantes na vida dos mais novos –escola e família– é que o mal-estar dessa relação recai sobre os mais novos. Crianças e adolescentes percebem de começo quando os pais perdem a confiança na escola, sem que isso precise ser dito com todas as letras. Sem a confiança dos pais na instituição, as oportunidades desta de educar ficam bem mais restritas.

Alunos também percebem que a escola não os leva em consideração nessa relação com seus pais, e isso colabora para que eles não deem autoridade a ela.

Se as duas instituições conseguissem esquecer seus próprios interesses e focassem as questões no aluno, o diálogo entre eles poderia ser estabelecido.

Os pais acham que há lição de casa em demasia? Que tal ouvir os alunos a esse respeito? A escola identifica muitas transgressões às regras que são impostas ao alunado? Talvez fosse produtivo rever as regras com os alunos.

Vamos permitir que filhos sejam alunos, e que alunos não sejam tão passivos nos processos escolares?


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