Folha de S. Paulo


A importância do vínculo

Sabemos que o vínculo entre pais e filhos –nos primeiros meses de vida entre a mãe e o bebê, em especial– é fundamental para a vida da criança. Inúmeros estudos e pesquisas já comprovaram essa tese.

Bebês ou crianças doentes, em hospital ou em casa, e até com risco de morte, podem melhorar graças a essa relação tão especial! O vínculo com outras pessoas também atua nesse sentido. Os "Doutores da Alegria", por exemplo, trabalham com essa hipótese e têm o maior êxito em sua missão. Quem conhece o trabalho desse grupo sabe disso.

A relação deles com as crianças doentes não é regular, sistemática. Mas, quando eles estão no hospital, conseguem criar esse vínculo ouvindo a criança –e nem sempre ela consegue falar– e estabelecem uma intensa e íntima comunicação com elas a partir do olho no olho.

Médicos, enfermeiras e profissionais da saúde reconhecem a importância do trabalho deles na recuperação de muitas crianças. Sabem, também, que, no atendimento de crianças, não basta a competência técnica: é preciso saber estabelecer esse vínculo com elas.

Os pais sabem disso muito bem: quando o filho adoece, fica manhoso, choroso. E a medicação, quando necessária, não basta para aliviar o seu sofrimento. A atenção dos pais e o acolhimento –que se dá por meio do vínculo– é, inclusive, um fator que colabora para o êxito do tratamento medicamentoso.

A educação dos filhos também exige a presença dessa relação intensa com a criança: ela se deixa ser educada a partir da percepção que tem da amorosidade que os pais lhe transmitem, mesmo quando precisam conter algum comportamento dela, impedir que faça alguma coisa que não deve ou levá-la a fazer algo que ela não quer naquele momento.

Essa amorosidade se revela na atenção verdadeiramente sincera que os pais estabelecem com seus filhos: na escuta atenta deles, mesmo quando eles parecem não querer falar, na firmeza quando necessária, na disponibilidade para conviver com a criança quando estão com ela.

Hoje, esse vínculo dos pais com os filhos está ameaçado: uma pesquisa realizada com crianças do mundo todo revelou que a média global de crianças que acham que seus pais usam demais o aparelho celular é de 54%.

O assustador é que esse índice, em nosso país, é bem mais alto: 87% de nossas crianças se sentem ignoradas pelos pais pelo uso exagerado que eles fazem do aparelho celular, com todos os recursos que ele oferece. São 87%, caro leitor! Ao olhar para esse número, entendemos perfeitamente o sentido de uma expressão que vem sendo utilizada há tempos por muitos profissionais: muitas de nossas crianças são órfãs de pais vivos.

Quem trouxe filhos ao mundo precisa responsabilizar-se por isso. E a única maneira de isso ocorrer é dar prioridade ao filho. Prioridade significa que os pais podem ter sua própria vida, mas que, acima de tudo, dão importância ao filho. Tem sido difícil isso ocorrer com os valores socioculturais do mundo atual.

É por isso que hoje, em nome de nosso futuro e de nossas crianças, faço um pedido aos pais: não permitam que seu filho faça parte desse índice de 87% de crianças que percebem que seus pais dão maior importância ao uso do celular do que a eles.


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