Folha de S. Paulo


Loucos por dinheiro

Tenho percebido um número grande de crianças, entre 8 e 12 anos, mais ou menos, que dá um valor exagerado ao dinheiro.

Uma mãe contou que nunca deu importância para roupas de grife. Econômica ao comprar vestuário para ela e os filhos, ensinou a eles os cuidados a serem tomados para que a roupa durasse até não servir mais.

Agora, a garota de nove anos deu de perguntar às tias e às amigas da mãe, sempre que as encontra, a marca das roupas que vestem.

E fica admirada quando a resposta que ouve indica uma grife muito conhecida.

Essa mãe não entende com quem a filha aprendeu a valorizar esse tipo de coisa e me perguntou como eliminar essa importância exagerada que a filha tem dado a marcas e preços de roupas, porque a família não se importa com isso.

Outra mãe contou que, depois de ler algumas de nossas conversas, decidiu solicitar ao filho, que tem 11 anos e é convidado a comparecer a festas de aniversário com muita frequência, que ele colaborasse com o valor do presente. A reação dele foi espantosa para essa mãe.

Ele chorou quase desesperado, disse que guardava a mesada que recebia e que deixava de comprar coisas que gostava só para não gastar, e que por isso não queria gastar em presentes.

Todos os argumentos da mãe e do pai para mostrar a ele que dinheiro deve servir para usar foram em vão. O menino chegou a dizer que, se fosse assim, não queria mais ir a aniversários. Os pais do garoto estão pensando em procurar ajuda profissional para o filho.

Esses dois exemplos nos bastam para refletir a respeito do valor do dinheiro em nossa sociedade e em como ajudar os filhos a dar a mais justa medida a ele.

Já sabemos faz tempo que as crianças carregam nos ombros o peso do mundo adulto, pleno de maldades e maledicências, preconceitos, improbidades, más intenções etc., que elas não têm ainda maturidade para entender como o oposto dos valores que a família tenta ensinar. E, muitas vezes, os noticiários apontam o dinheiro como o centro de muitas situações que envolvem tais características.

Ora, se vale a pena, para alguns adultos, correr riscos extremos por dinheiro, eles logo aprendem que ele deve ter um valor muito grande mesmo. E, claro, há também a sociedade consumista que precisa valorizar bens para que haja o consumo deles.

Natalia Ginzburg, em seu livro "As Pequenas Virtudes" (Editora Cosac Naify), aponta que o ensino da generosidade pode ser um bom antídoto a se ensinar aos filhos contra o valor excessivo que a sociedade dá ao dinheiro. Aliás, a leitura desse livro eu recomendo a quem tem filhos e quer dar a eles uma educação valorosa.

Em tempos em que a felicidade pessoal é colocada acima de qualquer outra coisa, a generosidade surge como uma possibilidade de dar alegria e, –quem sabe?–, um pouco de felicidade ao outro.

As crianças podem aprender, com o empenho da família, que dinheiro é só dinheiro: serve para garantir a sobrevivência –o que nem todos conseguem–, conforto e bem-estar. Ensinar os filhos a gastar é melhor, portanto, do que ensinar a poupar.

Quem aprende a gastar, logo pode aprender a guardar: quando tiver um bom motivo para isso.


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