Folha de S. Paulo


O importante ritual do sono

Quantas vezes, caro leitor, você precisou dormir cedo por algum motivo e, por mais que tenha tentado, o sono não chegou? E quantas pessoas você conhece, de qualquer idade, que sofrem e reclamam de insônia, permanente ou ocasional, e até tomam drogas para resolver o problema? E quantas vezes você precisou terminar um trabalho, mas o sono não permitiu que você se concentrasse? Isso sem falar das noites mal dormidas por causa de algum problema, conhecido ou nem tanto...

Como seria bom se pudéssemos controlar o sono e também os sonhos, não é verdade? Quem quer ter pesadelo? Mas eles são indomáveis!

Entretanto, mesmo sabendo disso e já tendo sentido na carne a situação, quando se trata de crianças -de nossos filhos- acreditamos que o sono deles possa ser treinado, domesticado, regrado.

Não pode. Ninguém consegue fazer uma criança dormir se ela não tem sono, ninguém consegue fazer uma criança permanecer acordada quando o sono a derruba.

O problema é que, desde que o bebê nasce, os pais já tentam se ocupar da questão e têm à disposição vasta literatura para ajudá-los, isso sem falar dos conselhos, que chegam de todos os lados. Todo mundo quer dormir, esse é o fato, mas se a criança não dorme, os pais também não.

Se o sono é indomável, significa que devemos deixar a criança dormir e acordar a qualquer hora e que os pais precisam se submeter ao ritmo dela? Não, evitemos os extremos.

Podemos ensinar à criança, por exemplo, que algumas situações favorecem o sono e que outras o impedem. Mais do que isso, precisamos antes reconhecer algumas questões importantes nessa equação criança/sono.

A primeira delas é que o sono da criança com menos de seis anos é instável mesmo. Ela pode passar um grande período dormindo muito bem e, logo depois, ficar com o sono totalmente desregulado -pelo menos na visão dos pais. Por que isso acontece?

Nesse período da vida, a criança passa por muitos momentos de crise que perturbam o sono. É o desenvolvimento, são as novas conquistas, são as angústias etc. Por isso, ter paciência e disponibilidade para aceitar o fato são pontos importantes para que os pais possam ajudar a criança a superar essa fase.

Segundo ponto: o ambiente onde a criança dorme é importante. Ele deve favorecer a tranquilidade e não ter muitos estímulos que provoquem a criança ou que a despertem.

E -talvez esta seja a questão mais importante- precisamos ajudar a criança a se preparar para o sono, ou seja, a entender que precisa se recolher. Criar um ritual que ajude a criança a sentir que está se recolhendo para dormir é o que podemos fazer.

Cada família escolhe como construir esse ritual e, dessa maneira, a criança entende que vai se despedir da companhia dos pais por aquele dia e que vai estar consigo mesma daquele momento em diante.

Se o ritual for bom para a criança, ela, mesmo sem sono, aprende -e consegue- a ficar em seu quarto sem exigir a companhia dos pais, sem fazer escândalos etc. Pode apostar que ela consegue!

Mesmo assim, de vez em quando ela pode reclamar. Aí, basta reafirmar a necessidade de seu recolhimento para ajudá-la a encontrar paz.

Por último, uma pequena lembrança: mesmo sem se dar conta, os pais podem colaborar com a dificuldade da criança de dormir bem. Por isso, sempre é bom rever as próprias atitudes quando os filhos ficam com o sono conturbado.


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