Folha de S. Paulo


Cadeia ou empregos?

Quando alguma coisa dá certo no Brasil, é grande a tentação de estragar tudo. Existe hoje no país uma onda de empreendedorismo na internet. São garotas e garotos espalhados pelas capitais e pelo interior, criando novas empresas de tecnologia na tentativa de se tornar o próximo Mark Zuckerberg. Esse é um dos fenômenos mais preciosos do país hoje. Só que, por causa de alguns deputados e deputadas, tudo está a perder.

Antes de entrar no problema, vamos aos números. Em artigo recente do site "TechCrunch" (a principal publicação sobre empresas e investimento no Vale do Silício), a jornalista Julie Ruvolo levantou alguns dados. Apesar da crise, só nos últimos três meses as start-ups (empresas iniciantes de tecnologia) brasileiras receberam US$ 150 milhões em investimento.

Mesmo com o PIB em queda, nos últimos 12 meses o setor de comércio eletrônico e serviços na web cresceu 20% no Brasil. Em São Paulo, acaba de ser inaugurado o espaço CUBO, reunindo 250 empreendedores. Nas palavras da jornalista: "Trata-se do espaço de coworking mais ambicioso que já vi, só perdendo para o Civic Hall em Nova York".

Ao mesmo tempo em que tudo isso acontece, está se formando no Congresso um pacote de criminalização que afeta o empreendedorismo digital no país.

Parte desse pacote está em construção na CPI dos Crimes Cibernéticos, conduzida na Câmara dos Deputados. Outra parte tramita em alta velocidade por meio do projeto de lei 215/15, já analisado nesta coluna. A conjunção de ambos levará ao "endurecimento" das leis criminais sobre a internet. Isso vai impor ainda mais obrigações a start-ups, sites e provedores. Vai obrigar todos, por exemplo, a guardarem cada vez mais dados de seus usuários, assimilando o custo dessa guarda.

É importante que nossos parlamentares compreendam que não se regula a internet "em tiras". Qualquer decisão sobre criminalização na rede afeta todo o ecossistema, inclusive do ponto de vista de negócios. O risco aqui é aumentar a burocracia, afugentando investidores e tornando o país ainda mais inóspito à inovação.

Ainda que as intenções desses projetos sejam nobres (combater crimes), o que o país precisa hoje não é de mais cadeias, mas sim de mais e melhores empregos.

Nesse sentido, é fundamental apoiar essas garotas e garotos que estão criando empresas de tecnologia no Brasil. Eles já enfrentam obstáculos o suficiente. Não precisam de mais. Nosso esforço legislativo deveria ser no sentido de apoiá-los, criando um ambiente favorável a eles. E não o atual foco monotemático em criminalização.

É preciso legislar para que a rede torne-se um fator de desenvolvimento e de inovação no país. Entre fomentar a criação de presídios ou de empregos, está na hora de trabalhar pela segunda opção.


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