Folha de S. Paulo


Democracia: o pior sistema?

No auge da crise política de maio último, um diplomata americano me perguntou como eu enxergava o cenário. "Uma bagunça", respondi. E ele, sereno: "Se não fosse uma bagunça, não seria uma democracia".

Nas democracias modernas, o poder é concedido a alguns poucos, escolhidos pelos eleitores. E aqui mora um dos maiores desafios da democracia. Ela funciona na premissa de que essas escolhas são racionais. De que os eleitores estarão bem informados, e entregarão o poder a quem melhor conduzirá o país.

Só que não. Quem vai votar e decidir é um grupo mais complexo e heterogêneo de pessoas.

Segundo Jason Brennan, filósofo de política de Georgetown, há três tipos de eleitores. O primeiro é dos eleitores que não se importam com a política. Suas vidas têm outras prioridades. Infelizmente, esse grupo é composto pela avassaladora maioria dos brasileiros.

O segundo tipo é composto por eleitores que acompanham a política como um hobby. Seguem o noticiário de perto, e têm opiniões defendidas com unhas e dentes, tão efusivamente quanto preferências de futebol. Esse grupo é uma minoria, porém barulhenta, da população brasileira.

O terceiro tipo de eleitor é o cientista, estudioso político. Sua profissão tem a ver com isso. Esse grupo é numericamente irrisório.

Essa primária classificação do nosso eleitorado já traz um problema-raiz da democracia. A maioria dos eleitores –o primeiro grupo– não acompanha política e economia, mas vai determinar o resultado das eleições. A questão que sucede é: como eles escolhem em quem votar?

Eles vão tentar identificar, do pouco que ouvem, se o discurso dos candidatos bate com seus valores pessoais. Vão fazer uma análise puramente subjetiva do que escutam, e decidir na última hora.

Esses eleitores são altamente vulneráveis a discursos populistas, a levar "gato por lebre". Suas decisões são puramente subjetivas, dependentes de efeitos retardados de ciclos econômicos, frutos de decisões, não raro, de governos anteriores.

O segundo grupo vota diferente. Eles elegem políticos que defendem (ou fingem defender) seus vieses ideológicos. Apesar de menos numerosos, são incansavelmente vocais sobre suas opiniões, exercendo forte influência nos seus meios. Esse segundo grupo não determina o resultado das eleições, mas influencia o primeiro, que decide.

Diante de tal quadro, e das falhas da democracia, a única chance de termos real renovação política em 2018 vem da disposição de influenciadores, do segundo e terceiro grupos, para influenciar.

Se as pessoas mais informadas resolverem sair de sua zona de conforto para vocalizar as possibilidades para o país, seja de pessoas ou ideias, há chance de comportamento eleitoral diferente. Se se enxergarem apenas como um voto a mais, teremos provavelmente mais do mesmo.

Essa parcela de sociedade, que teve o privilégio de acesso a educação de qualidade, onde provavelmente você, leitor, se encaixa, nunca teve papel tão crucial. Eu não me refiro à atuação em mídias sociais, onde se trava contato apenas com semelhantes, mas nas ruas, no boca-a-boca, no trabalho, na igreja, na sua comunidade.

Gerar debates, questionar, ponderar, principalmente depois de escutar, pode te fazer um dos personagens que determinará para qual lado irá o pêndulo brasileiro.

Apenas votar se torna, realmente, algo muito pequeno frente aos desafios do nosso Brasil.

Temos que mudar o país dentro das regras do jogo, e da nossa realidade. Dentro de uma democracia que, segundo Churchill, é "a pior forma de governo, exceto todas as outras".


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