Folha de S. Paulo


Desenha, Temer!

No próximo dia 12 de maio, Michel Temer completa um ano na Presidência da República. Tenho recebido perguntas recorrentes sobre a sua performance neste período -seus pontos altos e baixos.

O lado positivo é mais fácil de identificar —a retomada da independência do Banco Central, a mudança das políticas monetária e fiscal e um empenho em trazer reformas estruturais ao país criam condições necessárias (embora não suficientes) para a retomada do crescimento econômico. Somadas a algumas iniciativas pontuais, mas de alta eficiência, como a nova Lei das Estatais,Temer fez, em um ano, mais pelo longo prazo do Brasil do que Dilma em todo seu mandato. Os aspectos negativos, por outro lado, me parecem mais complexos e menos consensuais.

Como profissional de comunicação, enxergo um problema que vai além das questões mais evidentes, como a qualidade de parte dos nomes escolhidos para compor sua equipe e o fisiologismo, talvez ainda inevitável, de sua gestão. A comunicação.

Tomemos a reforma da Previdência. Seus desafios são indiscutíveis. Ela mexe com o bolso já esgotado do cidadão, e a destruição das expectativas que vem sendo construídas há décadas. Mas como explicar que uma parte da população ainda questione sua inevitabilidade? Não estamos tratando dos oposicionistas de plantão, capazes de criar qualquer falácia barata para se promoverem! Estamos falando das pessoas que caem nessas falácias. Se há tropeços para convencer a sociedade da mera necessidade da reforma, como se espera que ela entenda seus detalhes atuariais, complexos até para o mais experiente economista? O que se pode fazer para melhorar o entendimento dessa e de outras questões vitais? Comunicar-se bem.

Pesquisas há tempos demonstraram, por exemplo, que imagens facilitam o entendimento. A National Science Foundation, uma agência do governo americano que fomenta pesquisas, incluindo as do funcionamento cerebral, concluiu que 80% das pessoas são beneficiadas pelo uso de imagens na compreensão de ideias. A grande maioria das pessoas não consegue abstrair conceitos e magnitudes a partir de uma sequência de palavras dispostas num longo texto. Não adianta escrever, você tem que desenhar. Ao utilizar elementos visuais, gráficos, comparações de blocos, componentes simples mas com alto impacto, o cérebro melhor entende e retém números, tendências e conceitos. Um infográfico explica mais que um artigo ou um longo discurso, que é ainda pior do que a linguagem escrita por tirar da audiência o controle do ritmo, próprio de cada um. Além disso, um texto é recebido como opinião pessoal de quem o escreveu. Um gráfico é percebido como factual, impessoal, e evita objeções emocionais.

Outra técnica, que usa conceitos básicos de "storytelling", é personificar os dramas de um determinado problema. Quando aplicamos o problema a uma pessoa ou personagem, projetando nela suas dores e consequências, conseguimos fazer com que a audiência crie empatia pela situação —seja porque o problema também se aplica a nós, seja porque nós naturalmente nos importamos mais com um ser humano do que com um conceito abstrato.

O presidente Temer é dos mais acostumados e experientes em fazer política. E política vive de comunicação eficaz. Mas a comunicação na qual ele é especialista é uma comunicação entre pares, interlocução legislativa, montagem de acordos um a um. Isso funciona com o Congresso, mas não com o povo.

Seu desafio agora é o de se comunicar com milhões, com massas emocionais que são facilmente suscetíveis a discursos oposicionistas, populistas e falaciosos. Se ele não se cercar de especialistas no assunto e mudar a forma como se comunica, pessoalmente e como governo, vai enfrentar dificuldade crescente. Se ele não se utilizar de todos os instrumentos que a neurociência comprovou serem efetivos na forma como o cérebro funciona, incluindo a eficiência da simplicidade, ele vai cair na mesma armadilha que a maioria dos profissionais corporativos experientes já caiu: a de perder uma oportunidade, mesmo tendo em mãos o melhor produto. E neste caso, a maior perda não será dele, mas de todos nós.


Endereço da página:

Links no texto: