Folha de S. Paulo


Dilma, você venceu, lembra?

A estagnação do PIB brasileiro no terceiro trimestre, embora percentualmente igual ao da festejada Alemanha (!), forneceu munição adicional aos arautos do apocalipse. Para estes, aconteceu a tempestade perfeita. As contas do governo estão uma bagunça, há uma gastança sem controle, a indústria nacional fenece, os salários cresceram demais, os programas sociais são perdulários etc. etc.

Pouca importância deu-se a indicadores que caminham no sentido contrário. A ONU informa, por exemplo, que a disparidade entre regiões metropolitanas brasileiras diminuiu sensivelmente. Os números estão à disposição no Atlas do Desenvolvimento Humano, divulgado pelas Nações Unidas na semana passada. Detalhe: os melhores resultados ocorreram no Norte e Nordeste. Áreas onde, conforme sociólogos autointitulados esclarecidos, vivem os eleitores desinformados do PT.

Como contraponto, soube-se por intermédio desta Folha que o Estado onde a miséria cresceu mais, de 2012 a 2013, foi justamente São Paulo. O estudo, encomendado pelo jornal, é obra de pesquisadores do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade com base em dados do IBGE. São números absolutos, é verdade. Como São Paulo é o Estado mais populoso, pode-se considerar aritmeticamente "natural" que as quantidades sejam maiores –embora não pareça nada natural para cada uma das 125 mil pessoas rebaixadas à pobreza extrema no Estado.

Outro exemplo: segundo a Comissão Econômica para a América Latina, o Investimento Estrangeiro Direto recuou cerca de 23% no continente no primeiro semestre. O Brasil foi um dos únicos países da região em que este tipo de investimento cresceu, coisa acima de 8%. Nada mal para um lugar considerado à beira do abismo por gente que se diz tão bem informada.

O novo governo que assume em janeiro pode enxergar as estatísticas de várias maneiras. Pode cair na cantilena de que a oposição perdeu, mas levou. Esse é o mote do momento entoado pelos tucanos. O engraçado nesta leitura é que, em vez de engrandecer os derrotados, só faz desmoralizá-los ainda mais. Ou seja, até para supostamente colocar em prática a "política econômica" dos outros o povo acha melhor deixar o governo como está.

Felizmente existem outras alternativas. Vistos de outro ângulo, os algarismos são eloquentes: apesar de todas as dificuldades, o Brasil conseguiu ao menos reduzir danos de um dos momentos mais críticos da economia mundial. Sacrificou metas contábeis em nome da preservação de empregos e de renda da população. A esse respeito, não deixa de ser revelador que a mesma oposição adversária da mudança nas regras de superavit tenha votado em bloco pela troca de indexadores aliviando dívidas de Estados e municípios à custa da União –Aécio Neves inclusive.

O primeiro desafio do novo governo Dilma é esclarecer para qual lado pretende ir. Manter as coisas em banho-maria é um caminho. Só que em alguma hora a água seca, assim como as expectativas de quem votou em um rumo em vez de outro. Aumentar imposto? Ok, mas sobre quem vai pesar a fatura? Cortar gastos? Ok, mas onde a tesoura vai agir? Melhorar a produtividade? Ok, mas reduzindo lucros indecentes ou sacrificando salários? E por aí vai.

Já é hora de o distinto público ser informado, não, presidente?


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