Folha de S. Paulo


Doria precisa redobrar transparência pelo bem das parcerias com empresas

SÃO PAULO - João Doria recorreu a amigos empresários para garantir doações de xampu e sabonete aos precários abrigos para sem-teto. Assim como já acontecia com o Bolsa Família, só criticou quem jamais sentiu falta dessa ajuda.

O novo prefeito poderia ambicionar mais com essa diplomacia empresarial para transformar o centro e a cracolândia. Que tal convencer o banco Santander a dar algum uso bacana à vazia torre do Banespa? Convencer algumas dessas universidades privadas que cresceram tanto com incentivo federal a abrirem filiais nos muitos espaços subutilizados?

Senac e Fiap instalariam necessários cursos de programação na região mais bem servida por transporte público. Prédios históricos poderiam ganhar áreas de trabalho compartilhado ("coworking"). Se o retrofit não demorar cinco anos com burocracia, já é um começo.

O centro paulistano definhou porque tucanos e petistas só pensaram em centros culturais e repartições públicas para reanimá-lo, sem a interlocução com a iniciativa privada.

Depois do anticapitalismo juvenil e a promiscuidade com tubarões corporativos que dominaram o Brasil na última década, uma relação adulta e transparente poderia surgir nessas parcerias público-privadas.

Para isso, o prefeito não pode cometer o erro de cobrar por palestra no Lide, a empresa de multiplicação de contatos que criou, hoje comandada por seu filho. Convites são oferecidos a R$ 50 mil "para quem quiser se sentar à mesa com o prefeito".

Uma rara vantagem da chegada de Donald Trump à Casa Branca é dobrar o escrutínio sobre conflitos de interesse. Ainda dá tempo de cancelar a excentricidade (nem Bloomberg daria palestra sobre gestão eficiente com apenas dois meses no cargo) ou trocar os convites por doações a escolas. Em tempos em que até a amante de César precisa parecer honesta, não é só reforma em tríplex no Guarujá que deveria causar arrepios.


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