Folha de S. Paulo


Dirigentes brasileiros deveriam pensar no todo, não no particular

Cada um ao seu estilo, os presidentes do Flamengo e do Palmeiras fizeram seus clubes mudarem de patamar nos últimos quatro anos.

Eduardo Bandeira liderou a gestão que já pagou R$ 190 milhões em débitos e promete fazer o Flamengo ter um real arrecadado para cada real devido no final de 2017. Para melhorar a relação dívida-receita, fez mais do que economizar. Aumentou a arrecadação.

Paulo Nobre não é um mecenas. Não fez como dirigentes feudais que colocavam dinheiro do próprio bolso para tomar de volta mais tarde com juros. O problema do clube era ter débitos de curtíssimo prazo.

Nobre aumentou a dívida, mas alongou-a. Aprovou os empréstimos no Conselho Deliberativo e foi transparente.

O Palmeiras não termina o Brasileirão entre os cinco primeiros desde 2009. O Flamengo, desde 2011. O resultado das duas gestões é a polarização da disputa do título.

Em qualquer campeonato, Flamengo e Palmeiras poderiam expor suas experiências e servir de exemplo para outros clubes.

De um mês para cá, os dirigentes dos dois candidatos ao troféu disputam também a taça para saber quem é mais irônico e agressivo com o rival.

Uma coisa é quando jogadores e técnicos saem do calor do jogo para questionar se o campeonato está manchado ou não.

Outra é quando Paulo Nobre insinua que o Flamengo pode ganhar na mão grande.

Ou quando Eduardo Bandeira usa seu celular para mostrar à imprensa a imagem do suposto pênalti a favor do Figueirense, contra o Palmeiras, para repórteres no Beira-Rio, a 470 km de distância do local do erro.

Cada ação deste tipo desvaloriza o campeonato que será vencido por um ou por outro. Correto seria visitar a CBF e cobrar melhoria na arbitragem, que compromete os vinte clubes. Pensar no todo, não no particular.

No campeonato nacional mais organizado do planeta, o inglês, os técnicos vivem às turras. Os presidentes, não. Manchar o torneio significa afastar patrocinadores e correr o risco de torcedores fugirem das arquibancadas. Por que ir a um jogo manchado? Quanto mais credibilidade tiver o campeonato, mais chance de arrecadar.

Esta é a lógica empresarial. No Brasil, a estrutura dos clubes é política. O Fluminense pensou três vezes antes de pedir a anulação do Fla-Flu.

O presidente Peter Siemsen sabia o risco para a imagem de um time visto por muitos como rei do tapetão. Também conhecia o ônus de credibilidade do Brasileirão.

Só que não deve satisfação a acionistas. Deve a torcedores e à chapa que disputará eleições em novembro.

Por duas décadas, repetiu-se uma frase absurda sobre a gestão de Eurico Miranda: "Ele faz mal ao futebol brasileiro, mas faz bem ao Vasco". Se faz mal ao futebol brasileiro, obviamente não pode fazer bem ao Vasco, que ganhará mais e terá mais seguidores quanto melhores forem os campeonatos que disputa.

A lei de Eurico é inversamente proporcional à lei de Gérson, injustamente batizada nos comerciais dos cigarros Vila Rica nos anos 70.

Quanto mais o dirigente pensa no seu umbigo e atira contra o campeonato do qual participa, mais consegue levar desvantagem em tudo.


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