Folha de S. Paulo


É exagero colocar a Olimpíada como sonho antigo do futebol brasileiro

Micale evitou o mico. A seleção finalmente jogou bem, goleou a Dinamarca e seguirá neste sábado (13) caminhada pela medalha de ouro, obsessão das últimas décadas, o único título que nos falta e blá-blá-blá...

Não é bem assim. É exagero tratar a Olimpíada como sonho antigo do futebol brasileiro. A história do futebol olímpico dificultava alcançar a medalha até os anos 1980 e existia essa compreensão.

O futebol foi o segundo esporte coletivo a entrar no cardápio dos Jogos, em 1908. Só o polo aquático, oito anos antes, já fazia parte. O basquete foi introduzido em 1932, o vôlei, em 1964. Nas primeiras disputas, em 1908 e 1912, a seleção brasileira nem existia.

O Brasil só entrou em 1952, justamente a primeira edição de que a URSS participou. Os Jogos mantinham a tradição dos atletas amadores, mas, na velha cortina de ferro, os craques tinham empregos estatais para se dedicar exclusivamente ao esporte.

O Brasil escalava bons juvenis. Dezessete campeões mundiais disputaram a Olimpíada vestidos com a camisa amarela sem o escudo da CBD e com o Cruzeiro do Sul em seu lugar. Em 1952, a seleção tinha Zózimo aos 20 anos e Vavá com 18. A Hungria tinha Kocsis, 23, e Puskás no ápice aos 25. O mesmo time titular da Copa de 1954 em que encantou o planeta.

De Helsinque a Moscou, 1952 a 1980, 24 medalhas estiveram em disputa e 21 foram para o Leste Europeu. Só Dinamarca, prata em Roma-60, Suécia e Japão, bronze em Londres-48 e México-68, quebraram a hegemonia. Ouro só para a cortina de ferro.

Os profissionais foram aceitos no torneio olímpico de futebol nos anos 1980, mas não os que tivessem entrado em campo em jogos de Copa. Foi assim em 1984 e 1988. Em 1992, nasceu o limite dos 23 anos. A regra persiste com três exceções, liberadas em 1996.

Desde a entrada dos profissionais, o Brasil é o país com mais medalhas. São cinco, três de prata, duas de bronze. A Argentina, rival mais próxima, tem três. Só que duas de ouro. A diferença é que os argentinos entenderam o ciclo olímpico como resultado final dos dois mundiais sub-20 anteriores. Coloccini, Ayala, Mascherano e D'Alessandro foram campeões mundiais de juniores e olímpicos, numa sequência de trabalho que levou ao primeiro ouro.

Aqui, a obsessão pela conquista é tão falsa que sempre se montou a equipe em cima da hora. Até mesmo em 1996, quando Zagallo fez 19 amistosos mesclando os adultos com os sub-23, mas nunca definindo exatamente a equipe que iria a Atlanta.

A medalha faz falta, e será essencial ganhar da Colômbia neste sábado para manter a chance. Mas o torneio olímpico nunca foi o título mais importante do futebol.

Vale muito mais um trabalho sólido para chegar à Rússia com chance de disputar a Copa, que não vem desde 2002. Em Tóquio, 2020, é provável que a Olimpíada seja disputada apenas por jogadores abaixo de 20 anos.

A medalha não vai valer ouro.


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