Folha de S. Paulo


O abismo

O último título mundial do Barcelona, em 2011, foi tratado no Brasil como choque de realidade. Pep Guardiola trata aquele 4 a 0 sobre o Santos de maneira diferente. Em seu livro, "Guardiola Confidencial", aquela partida é citada como a mais perfeita exibição do Barça.

Individualmente, aquele Barcelona era inferior ao que ontem derrotou o River Plate e conquistou o terceiro Mundial de Clubes, com Luis Suárez, Messi e Neymar. Mas coletivamente, a equipe de 2011 era melhor. Contra o Santos, foi a melhor exibição do melhor Barcelona.

A vitória sobre o River faz a Espanha igualar o número de conquistas com o Brasil: quatro a quatro desde que a competição virou oficial da Fifa. A conta é irreal. Mais justo é observar como a velha Copa Intercontinental era disputada antes da lei Bosman, em 1996.

Editoria de Arte/Folhapress
Campinho PVC 21.dez

Até ali, havia limite de estrangeiros na Europa. A vantagem era sul-americana, com 20 títulos contra 14 europeus. Desde que os clubes da Europa passaram a ter seleções mundiais, sem restrição de nacionalidades, a soma das Copas Intercontinentais e Mundiais da Fifa registra 16 títulos da Europa, seis da América. Um massacre.

Os sul-americanos só conjugam o verbo vencer quando enfrentam times em mau momento. Contra Real Madrid, Barcelona e Bayern de Munique, é impossível.

A tendência é julgar que o futebol sul-americano está em péssima fase por produzir menos talentos. Ops... O ataque campeão mundial do Barcelona é formado por um argentino, um uruguaio e um brasileiro. O abismo tático e técnico é muito menor do que o econômico.

Mas a pobreza de talento provoca algumas confusões de ideias. É comum ouvir no Brasil que vencer a Libertadores exige um tipo de jogo específico, mais forte, mais raça, mais vibração. Mentira deslavada. Se no início da década de 80, com menos câmeras e mais violência, o Flamengo pôde vencer com o time de Zico, de pura técnica, por que não é possível ganhar hoje à custa de qualidade?

O River Plate foi o ano inteiro uma equipe sem acabamento. Primeiro confiou em Pisculichi, um jogador médio que viveu um momento grande nas finais da Copa Sul-Americana de 2014. Confiar nele custou jogar pessimamente a fase de grupos da Libertadores e classificar-se a duras penas.

Nas semifinais, perdeu Teo Gutiérrez para o Sporting de Portugal. Teve a sorte de descobrir Alario, centroavante do Colón de Santa Fé, autor de gols na semifinal e na decisão da Libertadores. Seu melhor jogador, Carlos Sánchez, tem muita força e pouca técnica. O River jogou sempre com bolas longas, erros de passes e gols de bola parada.

A final deste domingo (20) aconteceu entre o melhor time do planeta contra um sul-americano que não representa o melhor futebol do continente. Melhorar o nível técnico e ficar só com o abismo econômico só é possível com investimento pesado na organização da Libertadores. É impossível exigir mais qualidade dos estádios, mas é possível melhorar os gramados e pagar cotas mais altas para os participantes, como prometeu o presidente da Conmebol antes de ser preso.

Se os representantes da América do Sul souberem que precisam colocar a bola no chão e não dar bicão para vencer a Libertadores, chegarão aos Mundiais ainda em inferioridade. O abismo econômico vai persistir. Mas a distância do estilo de jogo pode diminuir.

O SORTEIO
Os representantes brasileiros vão a Assunção para fazer pressão política por melhores condições na Libertadores. Mas a graça do sorteio será outra: pela primeira vez, os times serão conhecidos e os grupos indicarão a força de cada equipe.

O SÃO PAULO
Quem precisa de mais atenção é o São Paulo. O rival da primeira fase pode ser difícil. O Santa Fé, campeão da Sul-Americana, por exemplo. Haverá menos de um mês para montar o novo time e não correr o risco Tolima, como o Corinthians de 2011.


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