Folha de S. Paulo


Questão de Estado

O pior Brasileirão da história dos pontos corridos terminou com o pior episódio de todas as rodadas finais. Não faz ainda duas semanas das mortes no estádio do Corinthians em Itaquera e quatro pessoas foram levadas para o hospital São José, em Joinville.
Entre os dois acontecimentos, a presidente Dilma Rousseff discursou sobre o futebol estar no coração de cada brasileiro.

É tempo de estar no dela.

O futebol é questão de Estado. A participação no PIB é de 0,2%, contra 1,2% na Espanha. Fazer do futebol um espetáculo seguro onde todos queiram estar presentes transformará sua participação na economia do país.

Ou a presidente Dilma Rousseff age ou fará o Brasil passar vexames semanais daqui até a Copa do Mundo --e durante ela também-- como passou nas duas últimas semanas.

A vergonha nacional desta temporada passa pelo que se viu neste ano em campo.

Tecnicamente, o Campeonato Brasileiro foi o pior dos últimos dez anos. A pior média de gols também, empatado com a competição do ano passado com 2,47 por partida. Na Alemanha, a média de gols é de 3,23 por jogo.

Na quinta-feira, na Costa do Sauipe, o técnico italiano da Rússia, Fabio Capello, elogiou a seleção brasileira, comparando-a às equipes europeias: "Scolari escala um meio de campo robusto", disse.

Uma parte do que se vê no campeonato é característica do futebol do Brasil, seu estilo. Outra parte, falta de atualidade.

O Cruzeiro foi campeão jogando bem, mas com muito mais espaço entre suas linhas de volantes e atacantes. Muito mais do que deveria haver.

Tem a ver com o cansaço dos jogadores.

Os jogos do segundo turno foram piores do que os do primeiro, porque se jogou sem descanso em todas as quartas e domingos. Se o jogador tem pernas para correr, corre. Ocupa espaços, cria boas jogadas, melhora a qualidade do jogo.

Nos últimos dez anos, discutiu-se a qualidade dos jogos disputados no Brasil, mas não o equilíbrio. Neste ano, também houve espaço demais na tabela de classificação. Doze pontos entre o campeão e o vice é a terceira maior distância entre os dois melhores times do campeonato. Só o título do São Paulo de 2007, com 15 pontos sobre o segundo colocado, e do Cruzeiro em 2003, 13 acima do segundo colocado, foram maiores.

Mesmo com tudo isso, esta segunda-feira poderia ser o dia de comemorar a participação mais forte de clubes de fora do Rio de Janeiro ou de São Paulo. Foi só a terceira vez na história em que campeão e vice não foram cariocas nem paulistas. Não acontecia desde o título do Bahia em 1988, com o Inter em segundo lugar.

O que há de bom fica em segundo plano. Ficará enquanto o Estado brasileiro não agir.

A DIFERENÇA

As homenagens para Tite nas últimas cinco partidas do Corinthians no Brasileirão são justas, pelo que fez entre 2010 e 2012. Mas acontecem mesmo porque a despedida foi anunciada semanas atrás. Houvesse a renovação e certamente alguém reclamaria do time que não faz gols e perde até do Náutico. A saída de Tite e a chegada de Mano mudam o perfil do treinador. No Corinthians, a frase é que Mano sabe ser mau quando é preciso. Tite, não. O bom caráter pode ter sido um dos motivos de não ter conseguido tirar o mesmo desempenho dos jogadores campeões mundiais durante todo o ano.


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