Folha de S. Paulo


Sem reformar a política, como reformar a economia?

Somos incansáveis na repetição do mantra das reformas. O Brasil precisa fazer um ajuste fiscal permanente que mude a trajetória de nosso endividamento. Para isso, precisamos de alterações na Previdência que reduzam o valor ou duração das aposentadorias; ou elevem as contribuições dos trabalhadores. O problema é urgente. Se não corrigirmos a trajetória de gastos agora, enquanto podemos, vamos nos transformar numa Grécia que importa azeite, e condenar nossos netos à mediocridade ou à pobreza.

Cada ponto do mantra das reformas é verdadeiro, inclusive o trecho sobre a urgência. Devemos discutir o formato das reformas e incluir emendas na proposta inicial do governo, sim. Mas não podemos nos eximir de fazer celeremente aquilo que é necessário.

Levando a conclusão ao limite: qualquer governo genuinamente comprometido com reformas deve ser apoiado. Caso contrário, podemos perder a oportunidade de corrigir o rumo e acabar caindo do precipício.

Quem dera fosse tão simples assim!

O Brasil é uma democracia representativa. Assim, escolhemos nossos representantes, deputados e senadores, e estes são incumbidos de escrever e aprovar as leis. A ideia por trás da democracia representativa é que as pessoas determinem um grupo de representantes especializados em cuidar dos negócios do Estado enquanto a população toca a vida. Desse jeito, o padeiro e a bailarina não precisam se preocupar em equilibrar o Orçamento ou em decidir que pontes devem ser reformadas.

Mas o alicerce da democracia representativa é a legitimidade. Deputados e senadores têm um poder legal que emana dos votos que receberam. Mas esse poder legal necessita de legitimidade para ser exercido em sua plenitude.

Se a população duvida da sinceridade de seus representantes, reformas de grandes consequências podem até ser aprovadas, mas não terão permanência. Uma próxima legislatura pode "des-reformar" e fazer um remendo pior que a situação original.

Voltemos ao Brasil do mantra das reformas necessárias. Que nossos representantes se esforcem para melhorar as propostas e, finalmente, consigam aprová-las. Mas que também saibam que as reformas só virão para ficar se a maquinaria de combate ao crime que enredou tantos de nossos políticos continue a funcionar, implacável.

Se, quando chegar 2018 (ou 2022), tivermos aprovado as reformas necessárias, mas as mesmas raposas velhas viciadas em propinas ainda mandarem em Brasília, vai ser difícil dizer não para os radicais de ideias mágicas.

Fazer as reformas enquanto as raposas velhas continuam soltas é construir uma autoestrada para Caracas e o caos.

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