Folha de S. Paulo


Ao elevar impostos, governo recorre à pior opção de ajuste fiscal

Sergio Lima - 20.jul.17/AFP
Brazil's Finance Minister Henrique Meirelles gestures to journalists while leaving the ministry, after announcing an increase in fuel taxes to keep the fiscal deficit target this year, in Brasilia, Brazil, on July 20, 2017. / AFP PHOTO / Sergio LIMA ORG XMIT: SLI
Henrique Meirelles (Fazenda) fala com jornalistas após anúncio de aumento de tributo de combustíveis

O recente aumento de impostos sobre os combustíveis indica que o governo começa a adotar soluções arcaicas contra o desequilíbrio fiscal.

A crise política e a consequente dificuldade para levar adiante a agenda de reformas reduziu o leque de opções, ameaçando a já explosiva meta de deficit público, fixada em R$ 139 bilhões (e mais de R$ 580 bilhões, 8,9% do PIB, incluídos os juros da dívida). Não cumpri-la significaria fragilizar a credibilidade do país em relação aos mercados e à sociedade.

É certo que a carga tributária maior pressionará os orçamentos familiares e os custos das empresas, agravando os efeitos da recessão. Além disso, envia uma mensagem ruim, já que a equipe econômica se comprometera, pouco mais de um ano atrás, a só recorrer a tal expediente em último caso.

Trata-se de solução paliativa para um problema de inegável urgência. Para evitar o risco de lançar o país no rumo da insolvência, a sangria fiscal precisa ser estancada com medidas que combatam distorções históricas e privilégios de poucos.

O equilíbrio fiscal conquistado a partir da redução de gastos públicos, nesse sentido, sempre se revela mais saudável e menos doloroso que o ajuste forjado com o aumento de impostos.

Nos últimos dias, o governo acenou que continua disposto a manter a prioridade na redução de despesas.

Depois de aumentar as alíquotas do PIS-Cofins dos combustíveis, anunciou um programa de demissões voluntárias para funcionários federais, que poderá ter uma moderada eficácia em conter gastos, mas vai na direção correta de desinchar a máquina pública.

Anunciou ainda estar em estudo o adiamento dos reajustes salariais de servidores programados para 2018. Deve insistir também no fim da desoneração da folha de pagamentos, que empacou na Câmara. Isso reforçaria a debilitada receita fiscal e iniciaria a já tardia revisão do emaranhado de incentivos fiscais.

Os chamados gastos tributários representam uma renúncia de arrecadação anual em torno de 4% do PIB, o suficiente para cobrir o deficit primário estimado em 2,2% do PIB neste ano.

Mas os deputados desidrataram o projeto, ainda em discussão, ao insistir em que o fim da desoneração ocorra em 2018, e não neste ano.

Mais: uma comissão mista do Congresso desfigurou o programa de renegociação de dívidas tributárias, o Refis, derrubando a estimativa de arrecadação de R$ 13 bilhões para pífios R$ 400 milhões.

No ranking de intenções frustradas, desponta a paralisia da reforma da Previdência. O adiamento dessa agenda é gravíssimo.

O projeto, aliás, deveria ser acompanhado por outras ações que gerassem resultados com maior celeridade, como o aumento da contribuição previdenciária dos servidores federais.

Tais iniciativas exigem articulação política e grande esforço de convencimento, haja visto que no próprio setor empresarial entidades que criticaram o aumento da tributação dos combustíveis recorreram à Justiça para barrar a reoneração da folha. É aquela história: farinha pouca, meu pirão primeiro.

O empresário e o cidadão que querem progredir percebem que o governo não deve abandonar a proposta original da equipe econômica para atender velhos interesses das corporações públicas e privadas.

Só assim não assistiremos de novo ao velho filme de que a conta mais uma vez não fechou e que precisaremos começar tudo de novo a partir de uma situação ainda mais delicada.


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