Folha de S. Paulo


A melhor resposta à crise política é avançar com as reformas

Ueslei Marcelino/Reuters
Brazil's President Michel Temer leaves the Jaburu Palace in Brasilia, Brazil May 18, 2017. REUTERS/Ueslei Marcelino ORG XMIT: UMS5
O presidente Michel Temer deixa o Palácio do Jaburu

Justo quando a economia dá sinais de se reconciliar com o crescimento e despontam as reformas que se fazem necessárias há décadas, o país sofre outro duro baque provocado por mais uma delação de arromba, desta feita atingindo o coração do governo, além de reforçar outras tantas denúncias recorrentes.

A expiação dos pecados das relações espúrias entre o público e o privado é sempre chocante, mas cabe ponderar se há outro jeito de depurar um sistema político apodrecido sem iluminar suas entranhas.

Por maior que seja a indignação, o que pode tranquilizar a sociedade é um conjunto de providências para que tais delinquências não se repitam, havendo, nesse sentido, clara analogia com o objetivo das reformas econômicas em processo.

Enfrentar tais problemas, avançando com o que precisa mudar na economia e na política em vez de paralisá-las no Congresso, é a melhor resposta que os políticos podem dar para uma sociedade descrente de suas lideranças.

A Justiça tem seu tempo próprio de ação, que não coincide com a da economia. Num caso, a demora pode prolongar injustiças. No outro, perdas econômicas e sociais muitas vezes irrecuperáveis.

A modernização das relações econômicas tem papel central na reconfiguração do desenvolvimento. Por isso, a fila das reformas precisa andar.

Após a fixação de limite para o gasto público e a revisão da Previdência e da legislação trabalhista, é preciso seguir com as reformas tributária e microeconômica, entre tantas outras.

É esse conjunto de fatores que elevará a produtividade e assegurará o crescimento de longo prazo. O ritmo de tal virada ganhará intensidade se for conjugado com a abertura da economia.

Deveríamos aproveitar o bom momento do comércio global, a despeito dos rompantes protecionistas de Trump, já que o Brasil continua entre as cinco economias mais fechadas do mundo.

Podemos concluir acordos em fase de gestação com União Europeia e México e reformular o que há com outros países, como Japão, Coreia e Canadá. Na América do Sul, fortalecer os laços com Chile, Colômbia e Peru e repaginar o Mercosul.

No plano interno, a agenda que nos espera pode evoluir a partir do entendimento de que nossa regulação foi estabelecida para atender a uma economia fechada e que se tornou obsoleta pela globalização e reposicionamentos geoeconômicos.

A política industrial é um exemplo. Sua concepção apoia-se na proteção indiscriminada. A contestação de programas como o Inovar-Auto e a Lei da Informática pela OMC propicia a oportunidade de rever essa diretriz.

Não há também como manter uma das estruturas tarifárias mais arcaicas do mundo. Sua complexidade e o elevado nível médio do Imposto de Importação pressionam os custos de produção em geral. É hora de o governo traçar uma rota de médio prazo para a convergência das tarifas ao nível praticado globalmente.

Nestes últimos 12 meses, progredimos pouco nesse terreno, mas, a bem da verdade, os maiores interessados nas reformas, as forças empresariais, pouco se empenharam em mudar o status quo.

Autoridades políticas e econômicas têm defendido a integração do Brasil à economia mundial, reforçada pelo desejo já manifestado oficialmente de o país associar-se à OCDE.

Um bom rumo, com um bom começo e muita a coisa a fazer —assim o Brasil começava a sentir o desenrolar de sua maior crise econômica.

Agora, com o governo ferido de morte, só resta cumprir rigorosamente o rito constitucional e lutar para que o consenso que vem se formando sobre o que é essencial seja preservado, porque, afinal, Deus é brasileiro.


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