Folha de S. Paulo


PEC do Teto abre portas para muitas reformas, como a da Previdência

Pedro Ladeira/Folhapress
Deputados da base do governo Temer comemoram a aprovação da PEC do Teto dos Gastos
Deputados da base do governo Temer comemoram a aprovação da PEC do teto dos gastos

Os resultados da emenda constitucional conhecida por PEC do Teto deverão ser muito maiores que somente uma dura reforma fiscal. Ela amarra o crescimento dos gastos federais à inflação do ano anterior por pelo menos uma década. E não apenas os gastos do governo, mas também os do Judiciário e os do Congresso.

Aprovada com folga na primeira de duas votações da Câmara (e haverá mais duas no Senado), o "novo regime fiscal", como o governo chama a PEC, traz o efeito de uma catarse inédita para a administração pública no país, ao induzir uma penca de reformas, começando pela da previdência privada e pública.

As consequências apareceram antes mesmo da aprovação final. O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, por exemplo, pediu à Câmara dos Deputados a retirada de pauta de 32 projetos que criariam cem novas varas e abririam vagas para mais 200 juízes e 8.000 servidores a um custo de R$ 1 bilhão por ano.

Desconhece-se tal desprendimento no setor público até onde a memória alcança. Já foi resultado da PEC do Teto. Segundo o presidente do TST, "o Estado brasileiro hoje está quebrado".

A multiplicação da Justiça do Trabalho dificilmente seria aprovada com "o novo regime fiscal". Objetivo, o ministro pediu ao Congresso acesso aos rendimentos dos depósitos judiciais de processos trabalhistas como contrapartida.

Demonstrações de altruísmo com os dinheiros sociais são raríssimas no setor público brasileiro. Mas esse talvez seja o maior efeito da indexação dos gastos fiscais à inflação –acordar os governantes e a burocracia para a impossibilidade de o orçamento público crescer à média anual de 6% reais, como observado nos últimos 25 anos.

Não há mais de onde tirar, com a sociedade submetida a uma carga tributária de país europeu e pagando juros de insolvente, além de estar permanentemente enredada pela inflação, sem ter como compensação serviços públicos eficientes.

Pode ser que decisões como a do presidente do TST se tornem comuns quanto mais os efeitos da PEC do Teto escancarem a porta do armário que oculta há anos distorções e deformidades na relação entre o Estado supostamente filantrópico e a sociedade.

Não combinam, por exemplo, a suntuosidade dos palácios dos tribunais em Brasília, o número de funcionários e o custo do sistema de Justiça com o resultado extremamente moroso dos julgamentos.

O Brasil ocupa a incômoda liderança mundial em despesas com sistema judiciário, como revela o estudo "O Custo da Justiça no Brasil", do professor Luciano Da Ros. O país gasta o equivalente a 1,3% do PIB com o Poder Judiciário, bem acima de economias avançadas, como os Estados Unidos (0,14%) e a Itália (0,19%), e de emergentes, a exemplo do Chile e da Colômbia, ambos situados na faixa levemente superior a 0,2%.

Despesa do Poder Judiciário - Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), em %

Leis escritas com maior clareza serviriam melhor à sociedade que um Judiciário enorme e um vasto mercado de serviços jurídicos. Tome-se a área trabalhista. São milhões de ações anuais e milhares em países com população e economia maiores, como EUA e Índia. Isso não é normal, assim como é absurdo, na área tributária, o emaranhado de normas causadoras de litígios.

Esse custo cresce desgovernado, como mostra o salto da dívida pública bruta de 51,7% do PIB em 2013, ou R$ 2,7 trilhões, a previstos 73% neste ano, R$ 4,5 trilhões. O deficit incluindo juros quase quintuplicou desde 2012: 10,4% do PIB em 2015.

A isso se adicionaram subsídios de juros bancados com dívida pública e desonerações mal concebidas, como dos encargos previdenciários. A PEC do Teto é o tratamento de choque contra tanta insensatez. Se dermos chance para emergir um país de empreendedores, o teto de que se fala será piso, tamanho o potencial de transformações que estão à vista.


Endereço da página:

Links no texto: