Folha de S. Paulo


A agenda necessária

As recentes medidas tomadas pelo governo, concentradas sobretudo na busca por maior disciplina fiscal, trouxeram alívio à sociedade e um início de melhora do humor da economia.

Mas a disposição em equilibrar as contas públicas não se esgota em si mesma e deve ser utilizada para promover outro tipo de agenda, voltada para a modernização e a remoção dos entraves ao crescimento.

Há sinais de que uma agenda com esse teor será apresentada pelo governo. Ela precisa, porém, ser logo explicitada tanto no conteúdo como no planejamento para que saia do campo das hipóteses.

Para conquistar credibilidade dos empresários e da população em geral, é necessário um cronograma rigoroso para implantação das reformas a serem enfrentadas nos próximos dois anos e meio, tempo que resta ao mandato presidencial.

Não se pode desconsiderar que a interinidade do atual governo inibe a apresentação de medidas cujos efeitos se manifestarão no médio e longo prazos.

Mas é também verdadeiro que a sociedade clama por soluções para os problemas que tolhem o desenvolvimento.

A transição rumo ao novo cenário se dá em duas frentes. A primeira visa corrigir as distorções nas políticas macroeconômicas dos últimos anos. A outra reúne ações no campo microeconômico para dinamizar o ambiente de negócios, a inovação e a produtividade.

O limite proposto à expansão das despesas públicas a partir de 2017 com base na inflação do ano anterior foi um começo promissor por impedir aumentos reais do gasto fiscal, conferindo um horizonte de queda para o endividamento público, e estimular a racionalização e a eficiência na gestão pública, abandonadas nos governos mais recentes.

A renegociação das dívidas dos Estados com a União, acompanhada de contrapartidas fiscais, equaciona pendência que se arrastava longamente, reduzindo o risco de deterioração das economias regionais.

Os avanços na área macro ainda não se fizeram acompanhar da evolução na regulatória, com objetivo de dar mais fluidez aos negócios.

Alguns itens dessa agenda estão encaminhados, como a revisão do marco regulatório do pré-sal. Se aprovada, a proposta já votada no Senado e tramitando na Câmara abrirá oportunidades para o país captar investimentos de grupos internacionais do setor.

Em outros pontos, pouco se avançou. Paralisado, o programa de concessões continua à espera de regras claras para atrair os recursos vultosos, essencialmente de origem privada, para levá-lo adiante.

Cabe insistir na questão da estrutura tributária, que prejudica o investimento, o empreendedorismo e a produtividade das empresas.

A modernização da economia não será crível sem a superação desses desafios e sem a revisão dos numerosos programas que implicam renúncias fiscais. Em vez de animar a atividade econômica, boa parte deles leva a um protecionismo nocivo à competitividade da economia.

Como tenho defendido neste espaço, nossas empresas continuarão defasadas na tecnologia e com baixa eficiência se não houver abertura da economia para o exterior.

Se o governo não for bem-sucedido no desafio de comunicar o novo rumo, o chororô dos grupos de interesses que nos levaram à atual crise prevalecerá, enterrando ainda no berço a agenda da transformação. Por isso, cresce a preocupação com os sinais de recuo no cronograma para encaminhamento da reforma da Previdência e com a aprovação do reajuste de salários do funcionalismo.

A sociedade anseia por crescimento econômico e por bons serviços de saúde, educação e segurança, por igualdade de oportunidades e democracia, e se mostra disposta a trabalhar duro nessa direção. A precondição para seu apoio firme reside em entender nitidamente a agenda necessária –e essa é tarefa urgente do governo.


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