Folha de S. Paulo


Um sopro de otimismo

Nada está resolvido na política brasileira, mas o ambiente econômico começa a desanuviar-se e apontar para dias melhores, dependendo do que se faça a cada momento daqui para a frente.

É verdade que esse leve sopro de otimismo ainda não se reflete com clareza nos principais indicadores econômicos. Mas estou convencido de que há uma crescente disposição do empresariado em transitar do cenário de desalento, que já dura tempo demais e passou do ponto tolerável, para um quadro menos negativo e de relativa estabilidade, apesar das ondas de choque da política.

Se o governo de Michel Temer conseguir superar os desafios inerentes ao interinato e os miasmas da Lava Jato, a retração econômica tenderá a perder força, e é vasta a capacidade ociosa da produção, inaugurando a etapa que antecede o reinício do processo de crescimento.

Sinais sutis de que a pior fase da recessão pode estar se dissipando começam a despontar. O índice da CNI que mede a confiança da indústria numa escala de 0 a 100 atingiu 45,7 pontos em junho, distanciando-se de seu nível mais baixo em anos recentes, registrado em novembro (35). E o índice de atividade econômica do BC, espécie de prévia do PIB, ficou praticamente estável em abril, após 15 meses seguidos em queda.

Alimentado mais pela vontade em acreditar em tempos melhores para a economia do que propriamente por fatos concretos, a expectativa empresarial continua à espera de ações efetivas do governo interino para que se consolide e não se esvaia com a mesma velocidade com que surgiu.

O primeiro passo nessa direção é eliminar os descompassos da política econômica dos últimos tempos, a começar pelo grave problema fiscal. Por isso, é alentadora a proposta de emenda constitucional que limita a expansão dos gastos federais com base no Orçamento de 2016 à variação da inflação de cada ano. A proposta é que esse teto se estenda pelos próximos 20 anos, a partir de 2017, podendo ser revisto no décimo.

Para ter êxito, o congelamento real do gasto público terá de endereçar o problema do deficit da Previdência, definindo novos parâmetros condizentes com a realidade demográfica de uma sociedade que envelhece a um ritmo maior que o da reposição da força de trabalho.

O controle rígido das contas públicas, se acompanhadas de medidas para desentravar a iniciativa empresarial, trará de volta a confiança de empresários e consumidores, estimulando a retomada dos setores produtivos. Estes, por terem amargado enorme retração nos dois últimos anos, têm condições de ampliar a oferta para atender a retomada da demanda sem grandes investimentos e sem pressionar a inflação.

Mas não nos enganemos: o crescimento econômico sustentado, que é uma das condições necessárias para o desenvolvimento social, precisa de muito mais que reforma fiscal e recuperação da confiança.

Reverter a curva declinante da taxa de investimentos e elevar a produtividade da economia são requisitos também imprescindíveis, o que, por seu turno, pressupõe a execução de uma segunda geração de reformas destinadas a modernizar o país.

Incluem-se aí a abertura da economia ao exterior para integração aos grandes mercados internacionais e atualizações sempre reivindicadas e nunca executadas, como nas áreas tributária e trabalhista.

E se faz urgente, também, enfrentar temas relevantes como o do financiamento de longo prazo, especialmente com a previsível redução do orçamento do BNDES, o que remete à premente prioridade de vitalizar o nosso mercado de capitais.

Enfim, as medidas que geraram o clima cauteloso de otimismo nas últimas semanas são positivas. Mas são só a base para construir algo maior, tal como a terraplanagem de um terreno para receber construções mais sólidas e duradouras alinhadas ao que o país tanto anseia.


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