Folha de S. Paulo


Falta convicção

Mesmo antes dos episódios que sacudiram o país nesta semana, de outro rebaixamento da nota de crédito soberano do país às novas prisões da Lava Jato, a economia já mostrava sinais de degradação e paralisia.

Com a operação esmiuçando as campanhas de Dilma, as adversidades políticas do governo devem aprofundar-se, embaçando mais o horizonte da economia e adiando decisões de que o país carece para estancar a recessão e voltar a crescer.

Em sentido figurado, é como se encolhesse, a cada sobressalto, o campo de jogo da economia, com suas medidas tendendo às do futebol society e com o risco de minguar a um tabuleiro de futebol de botão, se novos erros de política econômica não forem evitados e faltar urgência contra o gasto público, esse mal que nos consome.

Desde o início do ajuste fiscal, em 2015, faltou convicção ao governo para enfrentar o nó górdio da expansão de suas despesas, o que não é mais possível ignorar. Optou-se pelo aumento dos impostos, muito mais custoso em termos de produto e de criação de emprego, e pelo enxugamento marginal das despesas.

E assim permanece, apesar da sinalização da reforma da Previdência, absolutamente prioritária, mas insuficiente para corrigir as mazelas causadas pela indexação e vinculação das despesas de governo.

Como a arrecadação tributária cai na medida em que se generaliza a recessão e a fraca determinação impede o corte de gastos correntes, resta o pior ajuste possível, obtido com a redução do investimento público –receita para acentuar ainda mais a retração da economia.

Devido às escolhas erradas, as medidas fiscais, em vez de ajudarem a corrigir o desajuste orçamentário, aumentam o deficit e exacerbam as dúvidas sobre os rumos da economia em 2016. Não surpreende que a inflação venha batendo recordes neste início de ano, enquanto se desmancham as apostas de que ela chegaria a dezembro perto do teto da meta (6,5%), depois de atingir quase 11% em 2015.

A verdade é que o governo está sem capacidade de mudar o pessimismo que sentou praça no país. Com as projeções sobre o PIB de 2016 apontando para outro número tão ou mais negativo quanto deve ter sido em 2015, retração da ordem de 3,5% a 4%, não se concebem paliativos e medidas tópicas.

Se esse quadro se confirmar, combinando pelo terceiro ano seguido insegurança fiscal, inflação elevada e depressão da economia, as consequências serão dramáticas. Exemplificaria com três pontos.

Para Estados e municípios, a crise enfrentada em 2015 vai-se generalizar, com graves sequelas para o bem-estar social. A alta do desemprego e o achatamento da renda prejudicarão com força os mais pobres –um retrocesso que levará anos para ser revertido.

Do lado empresarial, a destruição em curso do capital deve avançar e tornar mais frequentes as quebras de empresas, colocando em risco a própria estabilidade financeira do sistema e a ordem social.

Não há mais como fechar os olhos diante do imobilismo político e da falta de liderança para tomar decisões e conduzir reformas que clamam por urgência. É preciso coragem e determinação do governo (seja ele qual for) para fazer o que for preciso, sem se curvar a interesses contrariados das corporações, aos despropósitos da base política e às conveniências do mandato, quando o que está em causa é a sorte de todos nós e de nossas empresas.

Ou irrompe a grandeza que nos eleva nas horas difíceis ou o futuro não nos concederá nada além do pessimismo que as agências de risco têm manifestado em série, rebaixando o Brasil da divisão especial à "segundona" das economias duvidosas. Merecíamos melhor destino.


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