Folha de S. Paulo


Sem mais delongas

Apesar do intenso debate que a grande crise de 2008 ainda provoca pelo mundo, no âmbito dos acordos comerciais a maioria dos governos não sugere hesitação.

Os casos do Trans-Pacific Partnership (TPP) e do Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP), ambos com os EUA à frente, o primeiro entre 12 países, o segundo com a União Europeia, atestam essa movimentação à margem do multilateralismo.

Com dimensões monumentais, é natural que tais acordos tenham evolução incerta, apesar do empenho redobrado dos governos dos países envolvidos para que as negociações cheguem a bom termo. O que os une é a convicção de que o caminho mais seguro para suas economias voltarem a crescer está no comércio entre as nações.

Em artigo no jornal espanhol "El País", Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), observa que durante 50 anos as relações comerciais avançaram a uma taxa equivalente ao dobro da evolução do PIB global. Nos últimos quatro anos, o processo foi revertido, de forma que o comércio deixou de ser motor do crescimento econômico mundial.

É preciso agir para não ficarmos para trás. Uma reviravolta na estratégia de comércio exterior deveria começar pela revisão dos laços que nos atam ao Mercosul.

É o que já fizeram, na prática, nossos principais parceiros, Argentina e Venezuela. Premidos por graves crises, viraram as costas para o bloco e foram cuidar de seus interesses, fechando acordos, sobretudo, com a China, mas muito mais amplos que os firmados pelo governo brasileiro, nesta semana, com o premiê chinês, Li Keqiang.

Não faz sentido marcar passo com a negociação que se arrasta por quase uma década com a União Europeia à espera sabe-se lá do que –e, do mesmo modo, ignorar o potencial dos Estados Unidos, mercado mais promissor para nossos produtos manufaturados.

Como tantos países que abriram de modo responsável seus mercados ao dinamismo do comércio mundial, não podemos nos dar ao luxo de ignorar os seus frutos, sob a forma de maior crescimento e de mais empregos com melhor remuneração.

Em nosso caso, na verdade, tal aspiração pode galgar mais um degrau, induzindo a adoção de normas de condutas, públicas e privadas, promotoras da eficiência da produção, da qualidade da regulação econômica e da fruição do processo inovador e da produtividade.

Estreitar as relações com o exterior será uma espécie de cartão de visitas para a modernidade da economia, o que implica que se faça acompanhar de políticas internas para não perder uma parte ou a totalidade do que a reinserção externa poderá aportar.

Um exemplo é a revisão da estrutura tarifária. Nossas tarifas de importação são elevadas para os padrões de qualquer economia nos tempos atuais. Além disso, desde a última revisão, há quase 25 anos, as distorções foram se acumulando, sobretudo ao acentuar o grau de proteção de bens intermediários em relação aos produtos finais.

É preciso dar prazo para os setores econômicos se adequarem a outro padrão tarifário, complementado por ações que removam as distorções tributárias, de financiamento e de logística.

Melhor ainda seria centralizar toda a política de comércio exterior em uma agência, tal como há nos principais países exportadores. O silêncio das lideranças políticas e empresariais sobre tal agenda é sintoma da falta de clareza para formular o caminho do crescimento.


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