Folha de S. Paulo


Do luxo ao fast-fashion, moda dá embalagem 'cool' ao feminismo

François Guillot/AFP
Modelo com camiseta da Dior em que se lê 'Nós devemos todos ser feministas' em desfile de 2016
Modelo com camiseta da Dior em que se lê 'Nós devemos todos ser feministas' em desfile de 2016

A entrada da primeira mulher no cargo máximo do estilo da grife francesa Christian Dior produziu um bem-vindo efeito manada na moda. Logo após a contratação da italiana Maria Grazia Chiuri, no ano passado, o feminismo defendido por ela em seus desfiles virou locomotiva de negócios, grifes e rede de fast-fashion no mercado nacional.

No início do ano, pequenas marcas focadas em venda on-line passaram a utilizar o mesmo teor político das camisetas Dior com o escrito "we should all be feminists" (todos devemos ser feministas), referência de Chiuri a um texto da escritora nigeriana e ativista Chimamanda Adichie.

"Grl Power", "Feminist" e "#GirlBoss" viraram, respectivamente, estampa para as roupas das marcas Sri Clothing, Giu Couture e 787 Shirts. Todas levantam a bandeira do feminismo.

Segundo a empresária e jornalista Giuliana Mesquita, que vende via Instagram as camisetas de R$ 80 produzidas sob encomenda pela Giu Couture, "feminist" é a palavra mais pedida pelos clientes, que escolhem qualquer escrito para ser bordado à mão na peça.

O manifesto foi assimilado por nomes consolidados do varejo. A grife Ellus 2ndFloor apresentou, na última São Paulo Fashion Week, uma coleção toda inspirada na Mulher Maravilha, personagem dos quadrinhos que foi um dos primeiros a representar a mulher em posição de comando.

A insígnia da heroína e as cores vermelha e azul do seu uniforme são alguns do detalhes que formam as referências da coleção à estética militar do desenho.

Mais acessível, uma versão fast-fashion da personagem acaba de entrar nas lojas da C&A. Jaquetas, coletes e calças com referências à Mulher Maravilha foram lançadas pela marca em parceria com o estúdio DC Comics, que além da moça liberou as imagens de The Flash, Batman e Super-Homem.

Quem também pegou carona no "empoderamento" foi o estilista Fabio Resende, chefe de estilo da grife mineira Frutacor. Ele mostrou no desfile de abertura da feira de negócios Minas Trend, na segunda-feira (3), em Belo Horizonte, uma camiseta com a palavra Fêmea impressa.

A peça compõe a primeira coleção da grife de Resende, a Miêtta, que agradou com o discurso de "enaltecer a força feminina", levando o segundo lugar do prêmio Ready To Go, criado pelo evento mineiro para apoiar revelações da indústria local.

Essa ideia de atingir o público feminino por meio de mensagens feministas começa a ecoar também nas práticas internas das empresas de moda.

A grife mineira de lingerie Potti Romã, por exemplo, aderiu a uma política de só trabalhar com mão de obra feminina. Neste mês, a marca da designer Lu Borges lançou um clube de assinaturas para estimular pequenas artesãs e empresas geridas por mulheres.

Por R$ 64 mensais, uma caixa é enviada às clientes com um kit composto por uma lingerie da marca e algum produto produzido por mulheres, de artesanato a comida.

É a mesma lógica de identificação entre criador e público-alvo usada pelas grifes internacionais. Além da Dior, com Maria Grazia Chiuri, e da Lanvin, com Bouchra Jarrar, no mês passado a grife Givenchy anunciou a contratação da ex-estilista da marca Cholé, Claire Waight Keller, para a direção criativa da etiqueta.

Ela é a primeira mulher a assumir o estilo da casa francesa e ficou famosa por desenhar roupas minimalistas de apelo "feminista".

Uma das coleções mais comentadas de sua carreira na Chloé foi a de verão 2017, inspirada na escritora francesa Anne-France Dautheville, feminista que nos anos 1970 se tornou a primeira mulher a rodar o mundo montada numa motocicleta.

Seja base para enlatado ou produto genuíno, o slogan "de mulher pra mulher" já é a embalagem mais "cool" na indústria da moda.


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