Folha de S. Paulo


Hermès arrisca e mantém plano de expansão ambicioso para o Brasil

O discurso do mercado de luxo em anos de crise é que o segmento os atravessa imune à turbulência financeira e ao conservadorismo do consumidor. Poucas marcas, no entanto, mantêm curvas de crescimento em períodos de vacas magras, e, em se tratando de Brasil, casos bem sucedidos são ainda mais raros. O da grife francesa Hermès é um deles.

Enquanto marcas de luxo americanas sofreram com os tombos do poder de compra das pessoas e fecharam portas –Kate Spade e Marc Jacobs, por exemplo– a marca francesa abrirá em meados de 2017 a terceira loja no país.

O próximo ponto, no shopping Iguatemi, na zona sul de São Paulo, será inaugurado menos de um ano após a abertura de uma loja de rua em Ipanema, no Rio, única da marca no Brasil que está fora de shopping centers.
Assim como a loja carioca, a nova será uma mistura de todas as linhas da marca. A experiência completa é potencializada pela área de 250 m² que ocupa um quarteirão inteiro do centro de compras.

Diferenciação e aproximação com o público brasileiro são os dois fatores que explicam o bom desempenho da marca no país e no mundo. Na Rio 2016, por exemplo, a Hermès forneceu todo o equipamento de selaria para a equipe brasileira de hipismo.

Maior legado da etiqueta, os itens de couro representam metade do faturamento da marca e sua produção é reconhecida como a mais exclusiva do mundo.

Mesmo com a ameaça de novos atentados na França e o esvaziamento das lojas, a grife é uma das poucas que acumula crescimento expressivo a cada trimestre.

O último relatório, do terceiro trimestre, apontou crescimento de 8% na receita em relação ao mesmo período de 2015, com cifras que chegam a quase R$ 14 bilhões em vendas.

À Folha, o vice-presidente executivo da Hermès, Florian Craen, explica a estratégia da empresa para sobreviver à crise brasileira e conta como o luxo na Europa foi impactado pelos atentados terroristas dos últimos dois anos.

*

Folha - Numa crise tão grave como a que o Brasil atravessa, acha prudente abrir mais lojas no país?
Florian Craen - Nunca foi uma questão de se iríamos abrir, mas sim quando abriríamos. Não podemos pensar em ter lucros expressivos rapidamente, porque nossa estratégia é expandir sempre e projetar o cenário daqui a dez anos. Estou seguro que, daqui dez anos, já estamos consolidados no Brasil.

As previsões do mercado não são animadoras.
Sim, sabemos que as coisas vão mal, mas, como em qualquer negócio, no nosso nenhuma decisão tomada hoje tem garantias de retorno amanhã. As coisas podem não estar maravilhosas, mas caminhamos lentamente. Veja, a segunda loja [no Rio] só abrimos sete anos depois da primeira [no shopping Cidade Jardim, em São Paulo].

Então o segredo é a parcimônia?
Somos muito seletivos. Temos apenas 230 lojas no mundo e acreditamos que crescer de forma pequena dá segurança, é sustentável.

É possível apontar erros de marcas internacionais em suas operações brasileiras?
Não poderia, até porque o movimento [a vinda de grifes estrangeiras] é muito recente. É fácil julgar as marcas por erros de curto prazo, mas só vamos entender como as coisas funcionam mais para frente. Muita gente criticou e questionou a abertura de uma loja de rua, mas espero estar certo e daqui cinco anos as pessoas nos vejam como bravos.

É que a estratégia da rua vai de encontro à da maioria das marcas internacionais, concentradas em shoppings. Por que tomou essa decisão?
Lojas de rua fazem parte dos nossos valores, são elegantes, têm charme. Além disso, a rua em que estamos [a Garcia d'Ávilam em Ipanema] é viva, tem bares, restaurantes e lojas de marcas brasileiras. É muito importante dividirmos espaço com esses locais e fazer parte da paisagem, se aproximar dos cariocas e dos brasileiros que passam pelo bairro. É uma loja pensada na estética do Rio, os produtos são coloridos, o espaço é iluminado, tem a ver com o clima. Era um desejo entregar um ponto assim no país, mas entendendo que o business dos shoppings são mais fortes e têm um fluxo de vendas maior. Por isso, continuamos a expansão nesses lugares.

Recentemente, a loja da Louis Vuitton nessa mesma rua foi assaltada. Vale o risco?
Tanto a Hermès quanto seus clientes convivem com isso no mundo inteiro, não só no Brasil. Tomamos todas as medidas de segurança possíveis para nos proteger de qualquer problema desse tipo.

Como o terrorismo, certo? Foram afetados com os últimos atentados?
Todos foram afetados. Tanto o atentado de Munique quanto o de Nice [ambos em julho] obrigou que fechássemos as portas por um tempo e, claro, houve perdas. Há receios, mas o erro seria parar, entende? Temos experiência de muitos anos com o problema do terrorismo, e a resposta para isso é sempre continuarmos, seguir em frente.


Endereço da página:

Links no texto: