Folha de S. Paulo


O disse me disse da Rouanet na moda (o início do fim)

O périplo dos estilistas Alexandre Herchcovitch, Pedro Lourenço e Ronaldo Fraga para conseguir recursos para seus desfiles, via Lei Rouanet (mecanismo de incentivo via renúncia fiscal), está prestes a acabar. E de forma não tão boa, nem para eles, nem para o Ministério da Cultura, que agora prova a ineficiência da lei como projeto de política pública para o setor.

Dos três designers envolvidos na polêmica instaurada no ano passado, quando a Folha revelou que a ministra Marta Suplicy reverteu a decisão da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura para garantir a captação de recursos para eles, apenas Lourenço e Fraga, conseguiram captar até agora.

Passados nove meses, duas semanas de moda de Paris, cidade na qual Pedro quer voltar a desfilar, e duas São Paulo Fashion Week, foram arrecadados R$ 680 mil dos quase R$ 7 milhões autorizados para os três projetos.

Desse montante, R$ 600 mil é só de Pedro Lourenço, que conseguiu incentivo da empresa de móveis planejados Della Anno e do laboratório farmacêutico Aché.

É preciso analisar a forma que esse dinheiro foi captado.

O prazo para conseguir patrocínio, inicialmente estipulado para novembro do ano passado, foi prorrogado duas vezes.

No "Diário Oficial da União" de janeiro deste ano, foram publicadas novas datas. Ronaldo Fraga tem até julho para captar o restante, já Herchcovitch e Lourenço, até dezembro e novembro, respectivamente.

Se for levado em consideração o atual sistema de sazonalidade dos desfiles, realizados a cada seis meses, nenhum projeto conseguirá cumprir seu plano inicial. Os designers teriam que planejar com uma antecedência irreal suas coleções.

Mais. Essa experiência comprova a tese de que apenas estilistas famosos conseguirão se beneficiar da "revolução" que o MinC esperava fazer no sistema da moda. Nem Herchcovitch, joia do lineup da SPFW, conseguiu recursos até o momento.

Seu livro ilustrado de 20 anos, que será editado pela Cosac Naify, captou apenas R$ 120 mil dos R$ 240 mil aprovados para o projeto que a editora submeteu.

A McDonald's, cujos uniformes dos funcionários o designer desenha, foi quem liberou parte da verba para a publicação.

Na última semana de moda de São Paulo, no mês passado, a ministra foi até o parque Villa-Lobos, onde aconteceu o evento, dizer que estava tudo bem. À Folha, afirmou que moda entrará no orçamento do ministério e que o Plano Setorial de Moda, que se arrasta desde 2010, está quase pronto.

"Mas eu posso desdizer depois", afirmou. É que, quando se trará de políticas públicas para o setor de moda, virou praxe desdizer.

Na época em que o secretário de Cultura da cidade de São Paulo, Juca Ferreira, era ministro da Cultura do governo Lula, foi realizado o primeiro encontro com estilistas e empresários, em Salvador.

A promessa era de que o plano citado por Marta sairia em 2011, mesmo que ele não continuasse na pasta. Saiu e nada foi feito.

Em junho de 2013, quando a reportagem acompanhou a primeira votação da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, foi dito que o tal plano estaria pronto e precisando apenas de alguns ajustes. Veio a Rouanet, tapou o sol com a peneira, e tudo foi desdito.

Um nova eleição avizinha-se. Do plano, que ajudaria a unir os elos da cadeia - costureiras, modelistas, estilistas, indústrias e instituições -para além da choradeira de estilistas e marcas por um mecanismo de renúncia fiscal excludente, ninguém sabe.


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