Folha de S. Paulo


Olho no Congresso e no voto

Protagonista em 2017, o Congresso Nacional passa por sua maior crise institucional.

O Supremo Tribunal Federal investiga 40% dos integrantes do Senado e da Câmara dos Deputados sob a acusação de crimes diversos. Vários foram presos, alguns destituídos por corrupção. Gabinetes legislativos foram alvo de devassas de operações policiais. Acusações de chantagem e negociações espúrias envolvendo projetos de lei e medidas provisórias atingiram dezenas de parlamentares.

Em meio a esse ambiente policial, por duas vezes os deputados recusaram a abertura de investigações contra o presidente da República, enredado em acusações de práticas corruptas por pessoas que privavam de sua intimidade.

Nas duas casas legislativas, somente a polêmica reforma trabalhista foi concluída. Volta e meia o leitor se surpreende com interpretações absurdas do texto aprovado.

As necessárias reformas política e previdenciária são mortos-vivos a assustar o futuro. Ficaram para as calendas gregas, aquele ponto inexistente do calendário, projetos que podem melhorar ou piorar a vida do cidadão brasileiro, grande parte deles só levada ao conhecimento do leitor em fase final de aprovação.

É o caso de discussões relevantes como a criação de leis que permitissem a realização de políticas públicas de segurança mais eficientes, o freio aos supersalários de servidores públicos, a revisão do pacto federativo e a ameaça de retrocesso nas regras do chamado aborto legal –só para citar alguns temas.

Assim, não foi surpresa que o Congresso tenha terminado o ano com a mais alta rejeição de sua história recente. Pesquisa Datafolha realizada em novembro mostrou que 60% dos brasileiros consideram ruim ou péssimo o desempenho dos atuais 513 deputados federais e 81 senadores. São aprovados por apenas 5% da população.

Tantas notícias originárias do Congresso foram cobertas de forma irregular pela Folha. É fato que as votações dos pedidos de afastamento do presidente foram prioridades exemplares, cobertas de forma competente, com antecipação de tendências e relatando ações de convencimento nada republicanas.

No entanto, em meio a esse turbilhão político, o cotidiano das casas legislativas foi muitas vezes deixado de lado. O amplo leque de assuntos com consequência direta na vida dos leitores acabou sendo coberto de forma precária, limitada, pouco destacada ou aprofundada.

Do conhecimento detalhado da atuação de cada parlamentar é que os eleitores precisam para definir seus votos. Durante anos, a Folha manteve levantamento exaustivo do mandato de senadores e deputados. Batizado de "Olho no Congresso", buscava avaliar o trabalho geral e individual, levantando a posição de cada um nas principais votações. Relatava do número de faltas ao de proposição de projetos e demonstrava os gastos de cada um no mandato, entre outros tópicos.

Buscava oferecer assim métodos objetivos de monitorar o trabalho parlamentar. Esse tipo de iniciativa, com as ferramentas de que dispõe o jornalismo de dados e o espaço infinito das publicações digitais, me parece serviço de primeira linha para ajudar os eleitores a avaliar com precisão os parlamentares.

Ao lado do acompanhamento mais frequente e crítico das novas formas de fazer política em gestação, essa é uma tarefa essencial para a Folha no ano eleitoral de 2018.

EQUILÍBRIO NA PREVIDÊNCIA

O presidente Michel Temer apontou na semana passada uma razão incômoda para que a reforma da Previdência fosse votada quanto antes. "A imprensa toda brasileira, sem exceção, está apoiando com editoriais e notícias. Então, a hora é agora", afirmou.

Uma das críticas que a Folha recebeu de seus leitores é que o noticiário do jornal tem sido parcial –com tom favorável ao projeto do governo e limitado no espaço a propostas dissonantes.

O secretário de Redação, Vinicius Mota, afirmou que "os editoriais da Folha apoiam a reforma da Previdência, mas o noticiário mantém-se equidistante em relação às posições em disputa, cumprindo o mandamento do Manual da Redação. Note-se, contudo, que a divergência nesse caso está concentrada nas propostas para combater o peso crescente dos gastos previdenciários nos orçamentos públicos. Há pouco dissenso técnico quanto à existência do problema, pois se trata basicamente de questão aritmética".

O adiamento da votação da reforma da Previdência para 2018 prorroga o desafio da Folha de buscar em seu noticiário o equilíbrio entre as razões daqueles que querem fazer a reforma da Previdência já e as dos que se posicionam contra a maneira como a discussão tem sido colocada até aqui.


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