Folha de S. Paulo


Como encarar uma avalanche de notícias?

Não faltou notícia importante na semana que passou. A reforma trabalhista foi aprovada. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado a nove anos e meio de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara rejeitou a denúncia contra o presidente Michel Temer acusado de corrupção passiva. A nova procuradora-geral da República foi nomeada.

Notícias tão impactantes em sequência dominaram as edições digitais dos jornais todos os dias e lançaram o desafio de criatividade nas edições impressas com especial interesse e relevância. Ao longo da semana, um quê de redundância entre as versões digitais e impressas foi percebido por leitores das diversas plataformas, sinalizando que o desafio não foi superado.

Na quarta, 12, por exemplo, todos os jornais reservaram suas manchetes para a reforma trabalhista. O enunciado da Folha foi seco, sem qualquer tentativa de interpretação ou desdobramento: "Senado aprova reforma trabalhista".

O texto da capa afirmava que reforma trabalhista é "defendida por empresários e contestada por partidos de esquerda e sindicatos dos trabalhadores". As páginas internas faziam referência apenas a sindicatos. Faltou informar a opinião dos principais interessados e afetados. E havia ferramenta para tal.

Pesquisa Datafolha mostrara que a maioria dos brasileiros rejeitava a reforma trabalhista. A maior parte dizia acreditar que a reforma beneficia mais empresários do que trabalhadores. Quadro publicado na edição confirmava essa percepção ao apontar em 15 pontos da reforma duas possíveis desvantagens para empresários e 13 possíveis desvantagens para trabalhadores.

O ponto a que pretendo chegar é que a cobertura de decisões do Executivo, do Legislativo e do Judiciário parece sempre empacotada nos gabinetes dos respectivos Poderes.

A vida dos interessados diretos é em geral subestimada. Foram poucas as reportagens com casos concretos sobre as mudanças que a reforma provocará, tanto para trabalhadores quanto para empresas.

No registro da condenação de Lula, a cobertura da Folha foi mais contida do que a dos concorrentes, abdicando do tom histórico que o momento exigia. O jornal manteve sua preocupação com o outro lado, ofereceu análises variadas, mas não teve reportagem ou edição que se destacasse.

Em meio a tanta notícia, faltou o que surpreendesse e mostrasse a Folha como imprescindível.

Entre a inovação e a desfiguração

A Folha já circulou perfumada, pintada de azul, com capa em inglês, com anúncios que percorrem páginas. Não é de hoje que a criatividade dos publicitários, de um lado, e a busca por anúncios do departamento comercial, de outro, interferem no formato da Folha (e de outros jornais). Com frequência, as iniciativas desagradam aos leitores.

Nesta semana, o primeiro caderno do jornal circulou alguns centímetros mais largo para abrigar anúncio da Gol. Leitores reclamaram de dificuldade no manuseio.

O diretor-executivo comercial do Grupo Folha, Marcelo Benez, explicou que "a ação publicitária inédita proporcionou ao leitor um volume de conteúdo editorial maior e mais extenso do que em edições tradicionais, quando é normal que anúncios e matérias convivam". A Gol foi anunciante exclusivo do primeiro caderno. Ao criar coluna extra para a publicidade, as páginas ficaram livres para o noticiário.

Em maio, ação comercial da Samsung fez intervenções sobre fotos. Um leitor disse ter se sentido "enganado". Outro questionou se as reportagens eram "patrocinadas". A dúvida é alerta do risco que o jornal não pode correr, o de ultrapassar o limite entre comercial e editorial.

Para o editor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, é "compreensível" o estranhamento. "Consideramos, no entanto, que tais iniciativas mostram a vitalidade da edição impressa do jornal. Como diz o Projeto Editorial, acreditamos que uma publicidade livre e diversificada é essencial para manter a independência do jornalismo aqui praticado."

O jornal inovar também em publicidade é revigorante para o meio, é claro. Ao mexer nas próprias características, entretanto, corre o risco de perder identificação com o leitor.

Folhapress
DESCONFORTO E DESORGANIZAÇÃO (10.jul.2017 e 13.jul.2017) 1. Mensagem publicitária da Gol aumentou a largura das páginas do jornal; 2. o do Bradesco, de aspecto mais frequente, tirou coluna de seu lugar habitual 3. CAPA FALSA (29.mar.2017) Muito parecida com o jornal, teve aviso discreto de que era anúncio 4. INTERVENÇÃO (15.mai.2017) Ação da Samsung em fotos de esporte exigiu texto explicativo
DESCONFORTO E DESORGANIZAÇÃO (10.jul.2017 e 13.jul.2017) 1. Mensagem publicitária da Gol aumentou a largura das páginas do jornal; 2. o do Bradesco, de aspecto mais frequente, tirou coluna de seu lugar habitual 3. CAPA FALSA (29.mar.2017) Muito parecida com o jornal, teve aviso discreto de que era anúncio 4. INTERVENÇÃO (15.mai.2017) Ação da Samsung em fotos de esporte exigiu texto explicativo

Endereço da página:

Links no texto: