Folha de S. Paulo


Colunistas devem oferecer mais do que os achismos das redes sociais

Lydia Megumi/Editoria de Arte/Folhapress

Uma das mais importantes e vetustas seções da Folha completou 40 anos de existência em 2016. Sem anúncio ou pompa, em 22 de junho de 1976 apareceu pela primeira vez na página 3 a seção "Tendências/Debates''. O editor-chefe, Cláudio Abramo, pretendia oxigenar o debate público brasileiro e as páginas do jornal com ideias e discussões promovidas por pessoas que não integravam seu quadro funcional.

Estabeleceu-se a partir daí uma das características mais fortes da Folha. Abrigar articulistas e colunistas representativos do espectro social, político, econômico e cultural, de modo a qualificar um jornalismo que se anunciava como apartidário, pluralista e independente.

Aos 95 anos, a Folha oferece mais de uma centena de colunistas para seu leitor. Se considerarmos aqueles que escrevem na versão digital do jornal, o número chega a 130.

Não por acaso os comentários sobre colunistas estão em segundo lugar entre os temas mais frequentemente abordados por leitores que escrevem para a ombudsman. Oscilam entre 10% e 15% das mensagens recebidas por mês. Perdem só para os que se referem a temas publicados no caderno "Poder".

A estreia da senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM) como colunista da página A2, na terça (2), despertou uma série de protestos. Afirmavam que o jornal aderia ao grupo contra o impeachment. Ela assumiu o espaço em substituição ao deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ), que agora é candidato a prefeito do Rio. O jornal não mantém colunistas em campanha eleitoral. O mesmo aconteceu com a senadora Marta Suplicy (PMDB-SP).

O leitor Ney José Pereira questionou a efetividade de medidas como essa: "Candidatos todos eles são durante toda a vida partidária ou política. Qual a diferença (moral, não legal), se é candidato oficializado ou se é permanentemente candidato?". Para ele, colunistas com mandato dispõem de variados canais de manifestação, inclusive em suas atividades: "Políticos eleitos têm sua tribuna especial nos Legislativos do Brasil".

Em outra direção, há a reclamação recorrente de que a Folha passou a privilegiar quem provoca mais escândalo ou xingamento em detrimento de quem provoca mais reflexão ou debate de ideias.

A Secretaria de Redação assegura ter a preocupação de tentar refletir o amplo espectro de valores e preferências da dinâmica opinião pública brasileira, mas evita o maniqueísmo da divisão direita/esquerda. Reitera que entre os critérios para escolher colunistas está a qualidade intrínseca, a representatividade e a pluralidade de temas e ideias.

Defende os colunistas-parlamentares: "Faz sentido dar voz a parlamentares e líderes partidários em algumas colunas, pois eles participam ativamente do debate na opinião pública. O jornal desestimula o uso do espaço para autopromoção. Prefere que seus colunistas promovam as suas ideias", delimita o secretário de Redação, Vinicius Mota. Recusa também a ideia de que escolhe colunistas estridentes como estratégia de marketing.

Concordo em que há um grau elevado de subjetividade na avaliação de colunistas, mas alguns pontos levantados por leitores devem ser levados em consideração pelo jornal nas escolhas daqui por diante.

Não acho que deva haver norma expressa de interdição de políticos ou parlamentares como colunistas. Um dos aspectos que incomodam é a pasteurização dos textos que a maioria produz. Na era das superassessorias de imprensa e da campanha eleitoral permanente, faz sentido elevar as exigências da qualidade, autenticidade e veracidade dos textos desses políticos-colunistas.

Tempos de redes sociais turbulentas sinalizam que é hora de reinventar as páginas de opinião. Os caminhos são muitos. É preciso novos filtros. São apenas 32 mulheres entre os 130 colunistas. A questão de gênero é apenas uma das que se apresentam num mundo multicultural. A multiplicidade de vozes está muito além de direita e esquerda.

O privilégio de ser publicado em um jornal com a história da Folha deve ser concedido a artigos mais analíticos e mais embasados jornalística e/ou cientificamente. Opinião desqualificada, sem amparo nos fatos, achismos interessados ou interesseiros pululam gratuitamente nas redes sociais.


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