Folha de S. Paulo


Anestesia por tragédias que se repetem

Na segunda-feira (19), o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) publicou um relatório mostrando que nunca na história houve tantas pessoas forçadas a deixar seus locais de origem por causa de conflitos, perseguições, violência ou violações de direitos humanos - 65,6 milhões.

Os jornais, revistas e televisões não dedicaram nenhuma chamada de primeira página, nem deram grande destaque à informação.

O perigo de nos acostumarmos com essa situação inaceitável é grande, quando ano após ano o número de refugiados e deslocados internos bate recordes.

Enquanto o Brasil e o mundo não prestavam atenção, o Sudão do Sul, o país mais novo do mundo, transformava-se de forma meteórica em um dos maiores problemas humanitários do mundo. Em pouco mais de seis meses, o número de refugiados sul-sudaneses saltou de 854.100 para mais de 1,4 milhão.

Para a representante do Acnur no Brasil, Isabel Marquez, a situação é ainda mais preocupante porque trata-se de refugiados procurando proteção em lugares que são igualmente frágeis e instáveis na África subsaariana. Até agora, o Acnur só arrecadou 50% dos recursos necessários para ajudar os refugiados sul-sudaneses.

O Brasil poderia fazer muito mais, diz Marquez. O número de refugiados recebidos pelo Brasil não chega a 10 mil - cerca de 0,005% da população. No Líbano, que fica ao lado da Síria, país que vive em guerra civil desde 2011, os refugiados são hoje 16% da população de 6 milhões.

No ano passado, em reunião sobre o problema dos refugiados, o governo brasileiro se comprometeu a receber mais 3 mil refugiados sírios nos próximos dois anos (já existem cerca de 2,6 mil hoje no país). É um bom começo, mas não adianta apenas abrir as portas. É preciso dar um mínimo de apoio.

Muitos não vêm porque não têm dinheiro para a passagem aérea. Outros chegam e precisam arrumar um fiador para alugar uma casa, andar horas de ônibus em busca de um curso de português e não recebem um pacote financeiro para que possam se estabelecer e sobreviver nesses primeiros meses. O Canadá, por exemplo, tem um sistema público-privado para receber os refugiados, com uma ampla rede de apoio. Recebeu mais de 40 mil refugiados sírios desde o fim de 2015.


Endereço da página: