Folha de S. Paulo


Como fica a vírgula com 'etc.'?

Carmen Jaspersen/AFP
Legenda:Polar bear baby
Ursa polar com filhote, em região no noroeste da Alemanha

Antes de ir ao que sugere o título desta coluna, quero trocar mais duas palavras sobre a questão abordada na semana passada.

Relembro isso com uma passagem do texto: "A Andrade Gutierrez afirmou, por meio de nota, que o acordo...". Como vimos, a expressão "por meio de nota" foi posta entre vírgulas, mas poderia ter ficado "solta", sem nenhuma vírgula. Não custa repetir: ou duas ou nenhuma.

No fim da coluna, afirmei que a extensão da expressão adverbial pode decidir a escolha (duas vírgulas ou nenhuma). Veja isto: "Os pesquisadores afirmaram que (,) durante o longo inverno polar (,) os animais...". A expressão "durante o longo inverno polar", intercalada, é formada por cinco palavras, o que para muita gente já é motivo para as vírgulas serem obrigatórias.

De fato, as gramáticas tradicionais costumam dizer que "expressões adverbiais de três ou mais 'corpos' são necessariamente virguladas". Essa "norma", que chega a ser um exagero, não é tão matemática assim. Quando intercaladas, expressões adverbiais longas (cá entre nós, o conceito de "longo" é um tanto subjetivo) costumam mesmo aparecer entre vírgulas. Mas o que vem a ser "longo" nesse caso? Entra aí uma coisa chamada "bom senso".

Às vezes, mesmo curtas, essas expressões são virguladas, para serem enfatizadas: "São plausíveis as avaliações de que, no momento, a proposição da matéria mal disfarça a intenção de intimidar...".

Isso também ocorre, por exemplo, quando se marca o tempo da mudança de posição de alguém: "O presidente afirmou, no mês passado, que queria a investigação cabal, mas, nesta segunda-feira, mudou de ideia e encerrou a questão". As vírgulas que marcam a intercalação de "no mês passado" e "nesta segunda-feira" realçam a mudança.

Melhor ainda seria usar o ponto e vírgula e começar os dois blocos pelas expressões adverbiais, que agora, por iniciarem cada um dos trechos, são isoladas por apenas uma vírgula: "No mês passado, o presidente afirmou que queria a investigação cabal do caso; nesta segunda-feira, mudou de ideia e...".

Para encerrar, abordo a sugestão de um velho companheiro de trabalho, o médico e professor (dos bons) Armênio Uzunian, que me honra com a leitura assídua da coluna: "No seu artigo de hoje, 17/11, e em muitos outros que leio, percebo que antes do primeiro 'etc.' não se coloca vírgula, mas, nos demais, em sequência, as vírgulas comparecem. Que tal um lembrete sobre isso?".

Vamos lá, caro Armênio. Como se sabe, "etc." é a abreviação de "et cetera", expressão latina que significa "e outras coisas" (hoje em dia se usa também com pessoas). São duas as correntes: uma, que leva em conta a etimologia, diz que a vírgula é desnecessária, porque a expressão já contém o "e"; outra diz que a noção etimológica se perdeu, o que faz do "etc." mais um elemento da enumeração. É por isso que ora se encontra algo como "...laranjas, bananas, etc." ora se encontra algo como "...laranjas, bananas etc.".

O "Houaiss" e esta Folha não põem vírgula antes do "etc.", mas outras publicações a colocam.

Quando há repetição do "etc.", a vírgula antes do primeiro segue o que acabamos de ver, mas os demais são vistos como os termos de qualquer enumeração, por isso ocorrem as vírgulas, como se faz em "...laranjas, peras, maçãs". É isso.


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